O Fenômeno do Pensamento
(Uma meditação de Pietro Ubaldi)
(Uma meditação de Pietro Ubaldi)
Abaixemos, portanto, as luzes e entremos no Templo do pensamento. Vamos penetrar num mundo de vibrações delicadas, de formas fugitivas, que o pensamento cria e destrói, mundo de fenômenos evanescentes e sutis e, no entanto, reais.
A insolubilidade de muitos problemas talvez seja motivada justamente pelo situá-los de maneira errônea: a solução é muitas vezes impedida pelo próprio preconceito, embora inconsciente; a conclusão já é dada pela primeira posição do problema.
Aproximamo-nos da gênese do pensamento. Talvez todo o fenômeno do pensamento não seja senão um fenômeno mediúnico de ressonância noúrica e possam ambos reluzir-se ao mesmo princípio; e assim, muitas diferenciações preconcebidas, que prejudicam a visão substancial do fenômeno não terão sentido.
Virão à luz expressões audazes e desconcertantes, mas quero levar à superfície da consciência — onde tudo é claro, sensível, racional — estes mistérios evanescentes das profundezas; quero medir este, quase direi — singular pensamento radiofônico, que tão estranhamente emerge dos abismos.
Desçamos às profundezas desse oceano que existe no íntimo de nossa personalidade psíquica.
Começo do exterior, da superfície, da descrição do ambiente. Não posso escrever em qualquer lugar. Num ambiente de desmazelo, desordenado, desarmônico, não asseado, novo para mim, não impregnado de minhas longas pausas do meu estado de ânimo dominante, não harmonizado com a cor psíquica de minha personalidade, não posso escrever senão mal e com esforço. Eis-me, ao contrário, em meu pequeno gabinete, ambiente de paz, onde os objetos expressam minha própria pessoa, onde a atmosfera é ressonante de minhas vibrações e tudo, por comunhão de vida, está sintonizado com meu temperamento. Por aí me deter, longamente, para pensar e escrever, saturei as paredes, a mobília, os objetos, de um particular tipo de vibração, que agora a mim retorna como uma música que harmoniza o meu pensamento.
Este é o primeiro problema: harmonização, que me permite a seleção de correntes e a imersão nelas; esses delicadíssimos estados de consciência não posso atingir senão num oásis de paz, através de um processo inicial de isolamento vibratório do violento ruído do mundo.
Antes de lançar-me à exploração do supranormal, tenho necessidade de encerrar-me, para minha ajuda e proteção, nesse invólucro de vibrações simpáticas, harmônicas, leves, como num veículo que me permita flutuar no oceano das vibrações comuns da vida humana, que são densas, sufocantes, cegas.
É noite, aproximadamente dez horas. É ótima hora, em que minha capacidade receptiva se intensifica, até cerca de 1 h da madrugada, em que diminui, então, por cansaço. Existe um antagonismo entre meu pensamento e a forte radiação solar; parece que a luz embaraça minha funções inspirativas, neutralizando as correntes psíquicas que me circundam. Amo as luzes tênues, difusas, coloridas, que deixam vaguear os objetos nos contornos indefinidos da penumbra.
Li que quando Chopin improvisava, fazia baixar as luzes e procurava a "nota azul", que devia ser a nota de sintonização entre sua alma e a do público.
No meu caso, o público está materialmente distante, mas espiritualmente está presente e próximo, e eu o sinto, imenso, estrondeando mil vozes: é a alma do mundo.
Minha solidão está cheia dessas vozes: é um oceano sem limites, que sobe em marés, ruge na tempestade, submerge-me e levanta-me em seus vagalhões. Depois se aquieta e escuta, vencido por essa potência de pensamento que me arrasta.
Em minha sensibilidade, o pensamento adquire o poder do raio, as correntes espirituais do mundo são tangíveis, essas forças sutis são reais; e entre elas vou avançando e com destreza navegando.
A princípio, sinto-me extraviado, sozinho no vácuo, e imploro apoio moral, consentimento, confiança. Peço às menores harmonizações de ambiente o primeiro auxílio para o impulso; peço um encaminhamento a uma cadeia de simpatias humanas, que funcionem como círculo mediúnico, embora espiritual e longínquo: uma espécie de caixa de harmonia das minhas ressonâncias espirituais.
Vou subir a uma atmosfera rarefeita e minha humanidade tem necessidade de um invólucro de simpatia que a aqueça e proteja, que a auxilie a lançar-se além da zona humana das tempestades, onde minha alma se encontra exposta ao embate de forças titânicas. Não se pode imaginar o poder de harmonização que emana de um ato de bondade; a bondade é uma música que eu respiro e que docemente me impele à corrente. Esta vibra muito mais pela bondade que pela sabedoria: é perfeição moral.
Para conquistar o conhecimento devo alcançar um estado de purificação, que é leveza espiritual. Apresentam-se, desde agora, as necessárias relações entre evolução e ascensão, de um lado, e mediunidade inspirativa, de outro; esboça-se a afirmação de que a verdadeira ciência não pode ser senão missão e sacerdócio.
Atingido o estado de tensão nervosa indispensável para submergir-me na corrente, esta me arrasta; o próprio estado de tensão me protege do choque das vibrações inferiores e o mundo humano desaparece, distanciando-se de minhas sensações. Basta a imersão nas noúres para poder absorver-lhe todo o alimento energético e atingir o isolamento das correntes inferiores. Isso constitui felicidade, êxtase, esquecimento de tudo, até o momento de despertar na consciência normal, em que há uma espécie de penosa turvação de potência perceptiva.
Pietro Ubaldi
Texto extraído do livro "As Noures", Cap. "O Fenômeno", de Pietro Ubaldi.
A insolubilidade de muitos problemas talvez seja motivada justamente pelo situá-los de maneira errônea: a solução é muitas vezes impedida pelo próprio preconceito, embora inconsciente; a conclusão já é dada pela primeira posição do problema.
Aproximamo-nos da gênese do pensamento. Talvez todo o fenômeno do pensamento não seja senão um fenômeno mediúnico de ressonância noúrica e possam ambos reluzir-se ao mesmo princípio; e assim, muitas diferenciações preconcebidas, que prejudicam a visão substancial do fenômeno não terão sentido.
Virão à luz expressões audazes e desconcertantes, mas quero levar à superfície da consciência — onde tudo é claro, sensível, racional — estes mistérios evanescentes das profundezas; quero medir este, quase direi — singular pensamento radiofônico, que tão estranhamente emerge dos abismos.
Desçamos às profundezas desse oceano que existe no íntimo de nossa personalidade psíquica.
Começo do exterior, da superfície, da descrição do ambiente. Não posso escrever em qualquer lugar. Num ambiente de desmazelo, desordenado, desarmônico, não asseado, novo para mim, não impregnado de minhas longas pausas do meu estado de ânimo dominante, não harmonizado com a cor psíquica de minha personalidade, não posso escrever senão mal e com esforço. Eis-me, ao contrário, em meu pequeno gabinete, ambiente de paz, onde os objetos expressam minha própria pessoa, onde a atmosfera é ressonante de minhas vibrações e tudo, por comunhão de vida, está sintonizado com meu temperamento. Por aí me deter, longamente, para pensar e escrever, saturei as paredes, a mobília, os objetos, de um particular tipo de vibração, que agora a mim retorna como uma música que harmoniza o meu pensamento.
Este é o primeiro problema: harmonização, que me permite a seleção de correntes e a imersão nelas; esses delicadíssimos estados de consciência não posso atingir senão num oásis de paz, através de um processo inicial de isolamento vibratório do violento ruído do mundo.
Antes de lançar-me à exploração do supranormal, tenho necessidade de encerrar-me, para minha ajuda e proteção, nesse invólucro de vibrações simpáticas, harmônicas, leves, como num veículo que me permita flutuar no oceano das vibrações comuns da vida humana, que são densas, sufocantes, cegas.
É noite, aproximadamente dez horas. É ótima hora, em que minha capacidade receptiva se intensifica, até cerca de 1 h da madrugada, em que diminui, então, por cansaço. Existe um antagonismo entre meu pensamento e a forte radiação solar; parece que a luz embaraça minha funções inspirativas, neutralizando as correntes psíquicas que me circundam. Amo as luzes tênues, difusas, coloridas, que deixam vaguear os objetos nos contornos indefinidos da penumbra.
Li que quando Chopin improvisava, fazia baixar as luzes e procurava a "nota azul", que devia ser a nota de sintonização entre sua alma e a do público.
No meu caso, o público está materialmente distante, mas espiritualmente está presente e próximo, e eu o sinto, imenso, estrondeando mil vozes: é a alma do mundo.
Minha solidão está cheia dessas vozes: é um oceano sem limites, que sobe em marés, ruge na tempestade, submerge-me e levanta-me em seus vagalhões. Depois se aquieta e escuta, vencido por essa potência de pensamento que me arrasta.
Em minha sensibilidade, o pensamento adquire o poder do raio, as correntes espirituais do mundo são tangíveis, essas forças sutis são reais; e entre elas vou avançando e com destreza navegando.
A princípio, sinto-me extraviado, sozinho no vácuo, e imploro apoio moral, consentimento, confiança. Peço às menores harmonizações de ambiente o primeiro auxílio para o impulso; peço um encaminhamento a uma cadeia de simpatias humanas, que funcionem como círculo mediúnico, embora espiritual e longínquo: uma espécie de caixa de harmonia das minhas ressonâncias espirituais.
Vou subir a uma atmosfera rarefeita e minha humanidade tem necessidade de um invólucro de simpatia que a aqueça e proteja, que a auxilie a lançar-se além da zona humana das tempestades, onde minha alma se encontra exposta ao embate de forças titânicas. Não se pode imaginar o poder de harmonização que emana de um ato de bondade; a bondade é uma música que eu respiro e que docemente me impele à corrente. Esta vibra muito mais pela bondade que pela sabedoria: é perfeição moral.
Para conquistar o conhecimento devo alcançar um estado de purificação, que é leveza espiritual. Apresentam-se, desde agora, as necessárias relações entre evolução e ascensão, de um lado, e mediunidade inspirativa, de outro; esboça-se a afirmação de que a verdadeira ciência não pode ser senão missão e sacerdócio.
Atingido o estado de tensão nervosa indispensável para submergir-me na corrente, esta me arrasta; o próprio estado de tensão me protege do choque das vibrações inferiores e o mundo humano desaparece, distanciando-se de minhas sensações. Basta a imersão nas noúres para poder absorver-lhe todo o alimento energético e atingir o isolamento das correntes inferiores. Isso constitui felicidade, êxtase, esquecimento de tudo, até o momento de despertar na consciência normal, em que há uma espécie de penosa turvação de potência perceptiva.
Pietro Ubaldi
Texto extraído do livro "As Noures", Cap. "O Fenômeno", de Pietro Ubaldi.
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