quarta-feira, 9 de setembro de 2009


Novos Caminhos que se Abrem para a Compreensão da Vida


Três objetivos do Espiritismo – Fé iluminada pela razão e razão iluminada pela fé – Como se pode “naturalizar a religião"


O grande trabalho do Espiritismo no mundo é mostrar aos homens a realidade da sobrevivência, a finalidade evolutiva da vida terrena e a necessidade de orientação evangélica do indivíduo e da sociedade. A sobrevivência, ao mesmo tempo em que liberta o homem do terror da morte, sobrecarrega-o de responsabilidades morais. A compreensão de seu destino evolutivo, alargando-lhe os horizontes mentais, aprofunda-lhe o senso dessas responsabilidades. E o Evangelho então lhe aparece na sua verdadeira significação de código divino, para orientação das criaturas terrenas em direção ao céu.

Não é somente o Espiritismo que prega a sobrevivência. Todas as religiões o fazem. Não é ele apenas que ensina a lei da evolução, através das vidas sucessivas. Numerosas escolas espiritualistas o fazem. Não é só ele que indica ao homem o roteiro do Evangelho. Todas as religiões cristãs o pregam. Mas acontece que o Espiritismo reúne, em sua estrutura doutrinária, tudo quanto mais condiz com o espírito do homem moderno: a sobrevivência não é apenas pregada por ele, mas sobretudo demonstrada, através de observações e pesquisas científicas; a reencarnação não é ensinada como um dogma de fé, mas como uma lei natural, que se pode comprovar em toda a natureza, e suscetível também de investigação científica; o Evangelho não é apontado como um código misterioso, em que as contradições ou dubiedades tenham de ser respeitadas, mas como um livro humano em que se refletem os ensinos divinos de Jesus, que a mente esclarecida deve saber separar dos elementos circunstanciais.

De um lado, pois, a missão do Espiritismo é restabelecer no espírito moderno, através da razão e da Ciência, a fé religiosa. De outro lado, porém, é libertar essa fé das imposições dogmáticas e dos convencionalismos sociais. Provando a sobrevivência, através de demonstrações científicas, o Espiritismo reforça a crença espiritual do homem, mas ao mesmo tempo transfere os motivos dessa crença, do terreno da fé dogmática, do crer pelo crer, para o terreno da razão. Demonstrando a realidade da reencarnação, como uma lei natural, o Espiritismo reafirma os ensinos de várias religiões e ordens teosóficas ou ocultistas, mas não o faz de maneira mística ou por motivos apenas tradicionais, e sim mediante o raciocínio e a pesquisa. Indicando ao homem os rumos do Evangelho, o Espiritismo restabelece a velha orientação cristã, mas não por obediência a costumes e sistemas, e sim pela compreensão da verdade dos princípios do Cristo.

O Espiritismo se apresenta, assim, como um elemento reorganizador da vida espiritual do mundo moderno. Suprime as divergências entre Religião, Filosofia e Ciência, reintegrando esses três ramos do conhecimento no contexto da consciência contemporânea, como três formas distintas do conhecer, mas necessariamente ligadas na harmonia do todo. Graças à sua posição renovadora, desloca os fatos espirituais do terreno incerto do miraculoso, para transportá-los ao da razão. Com isso, transforma a alma e o espírito, de objetos de suposições e especulações abstratas, em objetos de observação e pesquisa científica. Podemos dizer, repetindo uma expressão de Labriola, que o Espiritismo “naturaliza a Religião”.

É claro que toda essa revolução parece herética, para as pessoas apegadas ao misticismo religioso. Dificilmente uma criatura que se acostumou a crer por crer, a aceitar o que lhe disseram desde criança, a ter fé no mistério e a encarar o mundo e a vida como coisas procedentes do sobrenatural, poderá aceitar a posição renovadora do Espiritismo. Mas, por outro lado, as pessoas, cada vez mais numerosas, que não podem aceitar as crenças tradicionais, e que flutuam entre a crença e a descrença, encontrarão no Espiritismo um rumo seguro para a sua própria renovação espiritual.

A fé espírita, como dizia Kardec, é iluminada pela razão, mas a razão espírita, por sua vez, é iluminada pela fé, de maneira que não pode ser confundida com a razão cética. Enquanto esta é espiritualmente estéril, a razão espírita é espiritualmente fecunda, abrindo para a mente humana perspectivas cada vez mais amplas de compreensão do homem, do mundo e da vida.


José Herculano Pires
Do livro O Infinito e o Finito (Crônicas Espíritas do “Diário de São Paulo”)

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