domingo, 25 de novembro de 2012

O Genoma Humano e a Identidade do Espírito


As pesquisas sobre o Genoma Humano fazem surgir controvérsias a respeito da identidade de cada indivíduo. Porém o Espiritismo ensina: a individualidade pertence ao Espírito imortal.

“Por uma aberração da inteligência, pessoas há que só veem nos seres orgânicos a ação da matéria e a esta atribuem todos os nossos atos.” Esta frase aparece no início do comentário de Allan Kardec às questões 147 e 148 de O Livro dos Espíritos[1], a respeito do Materialismo. Os avanços no sequenciamento da molécula do DNA de vários seres vivos, incluindo o ser humano, estão permitindo aos cientistas descobrir as causas de uma série de doenças, como o câncer, proporcionar o desenvolvimento de produtos geneticamente modificados (os produtos transgênicos) e abrir perspectivas quanto à manipulação dos genes ainda durante o processo de formação do feto. Porém, essas pesquisas tem gerado o surgimento de questões éticas como a clonagem de um indivíduo e, recentemente, a questão do comportamento humano ser consequência de determinados genes1.

É sobre essa última questão que desejamos discutir nesta matéria. Ela se enquadra na afirmativa acima de Kardec e o destaque que o Genoma Humano tem recebido da mídia nacional e internacional revela a crença materialista por detrás dele. Motivados por um artigo publicado na revista internacional Journal of Molecular Biology (abril de 2002)[2] e por uma matéria publicada na revista Pesquisa Fapesp Especial (abril de 2003)[3] apresentaremos uma discussão sobre o assunto que consideramos ser de grande interesse ao movimento espírita já que ele envolve a questão da identidade ou individualidade dos Espíritos.

No artigo da referência [2], o professor de Bioética da Faculdade de Medicina da Universidade de Genebra (Suíça), Prof. Dr. Alex Mauron, questiona a crença de que todas as características do ser humano, incluindo os comportamentos e sentimentos de ordem psicológicas, são comandados pelos genes. Ele batiza essa ideia de “Metafísica genômica” pelo fato do Genoma ser considerado como sendo a “alma” de cada indivíduo. Os Espíritos são bastante claros a esse respeito [1]:

“361. Qual a origem das qualidades morais, boas ou más, do homem?

“São as do Espírito nele encarnado. Quanto mais puro é esse Espírito, tanto mais propenso ao bem é o homem.”

370. Da influência dos órgãos se pode inferir a existência de uma relação entre o desenvolvimento dos do cérebro e o das faculdades morais e intelectuais?

“Não confundais o efeito com a causa. O Espírito dispõe sempre das faculdades que lhe são próprias. Ora, não são os órgãos que dão as faculdades, e sim estas que impulsionam o desenvolvimento dos órgãos.”(Grifos nossos).

Um argumento apresentado por Mauron contrário à ideia de que a identidade de uma pessoa está diretamente associada ao seu Genoma é a existência de gêmeos monozigóticos, isto é, que possuem o mesmo Genoma. Desde que dois ou mais gêmeos são indivíduos diferentes, com comportamentos e identidades diferentes, fica evidente que não é o Genoma que determina a identidade. Porém, o professor Mauron não defende nenhuma tese espiritualista. Ele acredita que, em algum momento ao longo do desenvolvimento embrionário, existe algum tipo de evento material que determina a emergência da identidade pessoal do indivíduo. Essa “crença” (note que essa ideia não possui prova científica) reflete a postura materialista por parte do professor Mauron e da comunidade científica.

Por outro lado, apenas para vermos a importância de estarmos cientes dessas discussões, cabe mencionar que a ideia de que o Genoma determina a identidade de uma pessoa, desde o momento da concepção, favorece a luta contra o aborto e contra o uso de embriões humanos nas pesquisas científicas.

Portanto, pelo menos para defender a vida, essa ideia materialista tem alguma serventia.

O Espiritismo sela a questão ao ensinar que a causa de nossos comportamentos e de nossa identidade reside na nossa alma ou Espírito. As questões 150 e 152 de O Livro dos Espíritos[1] elucidam:

“150. A alma, após a morte, conserva a sua individualidade?

“Sim; jamais a perde. Que seria ela, se não a conservasse?”

152. Que prova podemos ter da individualidade da alma depois da morte?

“Não tendes essa prova nas comunicações que recebeis? Se não fôsseis cegos, veríeis; se não fôsseis surdos, ouviríeis; pois que muito amiúde uma voz vos fala, reveladora da existência de um ser que está fora de vós.”
1Um gene é um pedaço da molécula do DNA que é codificado numa proteína, que por sua vez, terá uma determinada função na célula ou no organismo de um ser vivo. Estima-se que o ser humano tenha entre 30 mil e 120 mil genes.

A chave para o problema da identidade de cada indivíduo está na pré-existência da alma que a traz consigo. A prova disso são as comunicações dos Espíritos que ao desencarnarem deixaram apenas o corpo físico e levaram tudo o que aprenderam. Lamentamos que a humanidade não reconhece isso como comprovação da sobrevivência da alma. O Genoma, do ponto de vista da Doutrina Espírita, é, portanto, apenas uma ferramenta do Espírito que o recebe para cumprir determinada tarefa no mundo material.

A compreensão desse importante detalhe está diretamente ligado ao problema levantado pelo professor titular de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo, Prof. Dr. Renato Janine Ribeiro, em sua matéria publicada na revista Pesquisa Fapesp Especial de abril de 2003 (referência [3]). O professor Ribeiro também questiona a expectativa de que a descoberta completa do Genoma Humano resolverá todos os problemas do ser humano, mormente, os de ordem psicológica e comportamental. Ele não discorda que esse avanço ajudará a resolver muitos problemas com doenças e insuficiências do ser humano. Mas ele questiona um outro aspecto que é de grande importância para nós espíritas.

O problema pode ser apresentado da seguinte forma, nas palavras do próprio autor[3]: “... há uma enorme tendência do ser humano a querer considerar-se coisa, objeto.” A ideia de que somos dirigidos pelas nossas características genéticas significa que não temos a liberdade de escolha. Apesar de não gostarmos dessa ideia, o professor Ribeiro argumenta que até mesmo a liberdade não é tão valorizada pois “ela implica responsabilidades”[3]. E como as pessoas tem fugido às responsabilidades, uma consequência é que: “...diante disso é comum desejar-se algo que resolva nossos problemas independentemente de nós mesmos.”

Não interessa o que causou nossos problemas e doenças mas sim como resolvê-los. “... se eu puder solucioná-los com um remédio ou cirurgia, não preciso responsabilizar-me, a fundo, por eles. Tratarei a mim mesmo como um objeto.”(Grifos nossos). Assim, a pesquisa do Genoma Humano favorece a filosofia do ser objeto e nos faz lembrar daquele antigo argumento dos que se eximem da reforma íntima: “... o espírito é forte, mas a carne é fraca”. Hoje, esse argumento se torna “... mas o genoma é fraco...”. É mais fácil crer que os nossos temperamentos desequilibrados são decorrentes dos nossos genes do que nos esforçarmos por reformar nossas tendências. É mais fácil acreditar que um dia a Ciência, com uma cirurgia, nos fará seres perfeitos do que acreditar no esforço próprio. Felizes que somos por conhecer a Doutrina Espírita que nos ensina perfeitamente o que é causa e o que é efeito. A causa reside em nosso Espírito. O efeito são os nossos atos, palavras e pensamentos. O corpo físico é apenas instrumento para que possamos trabalhar na obra da co-criação


Alexandre Fontes da Fonseca – Piscataway, New Jersey/USA – afonseca@rutchem.rutgers.edu
ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA INTERNACIONAL DE ESPIRITISMO, JANEIRO DE 2004, PGS. 624-626

O autor é Doutor em Física pela UNICAMP e “Post-Doc” no Instituto de Física da USP.
Atualmente, o autor é “Post-Doc” no Departamento de Química de Rutgers, The State University of New Jersey, EUA.

Referências
[1] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 76
a. Edição, (1995).
[2] A. Mauron, Journal of Molecular Biology Vol. 319, p. 957, (2002).
[3] R. J. Ribeiro, Pesquisa Fapesp Especial de abril, p. 38, (2003).
[4] A. Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, Editora FEB, 112.
a. Edição, (1996).

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