Eduardo Carvalho Monteiro, psicólogo por profissão, tem se dedicado a tarefa de preservação da memória do movimento espírita, sendo autor de diversas obras fundamentadas em suas pesquisas, entre elas "Anália Franco, A Grande Dama da Educação Brasileira", "Batuíra, Verdade e Luz", "Batuíra, O Diabo e a Igreja", "100 Anos de Comunicação Espírita em São Paulo". Também é o responsável pelo "Anuário Histórico Espírita" e grande incentivador da "Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas". Além de suas atividades como pesquisador e historiador, é assessor pró-memória da União das Sociedades Espíritas de São Paulo e criador do seu Centro de Documentação Histórica, bem como fundador e vice-presidente da Sociedade Espírita Anália Franco de Eldorado, Diadema. Não seria possível deixar de mencionar que Eduardo além de espírita é maçon e, assim, suas pesquisas tem contribuído para resgatar os laços históricos entre o Espiritismo e a Maçonaria em terras brasileiras.
GEAE - Eduardo, gostaríamos de iniciar a entrevista perguntando-lhe como foi seu contato com a história de Anália Franco. O quê o levou a estudar e publicar um trabalho sobre a vida da grande Educadora?
Eduardo - Trabalhava já com a memória do Espiritismo quando um amigo, Presidente do Núcleo Espírita Anália Franco, da Zona Leste - SP, começou a insistir comigo que iniciasse uma pesquisa sobre a Educadora. Comecei despretenciosamente recolhendo material sobre ela, acabei entrando em sua faixa mental e, depois de 5 anos de pesquisas, o livro saiu. Devo dizer que foi uma pesquisa que me empolgou desde que comecei a penetrar no universo da grande educadora devido à grande personalidade que estava retratando.
GEAE - Em linhas gerais, como se desenvolveu sua pesquisa? Nos parece que Anália Franco não tem tido, por parte do povo de São Paulo, o reconhecimento que merece, principalmente quando se vêem homenagens públicas a personalidades que bem menos fizeram pelo progresso da nação que ela. O fato de Anália Franco ter abraçado a Doutrina Espírita tem algo a ver com este "esquecimento"?
Eduardo - Como disse, foram cinco anos de pesquisa, cerca de trinta viagens pelo interior de São Paulo e Rio de Janeiro "perseguindo" seus rastros, em que tivemos a oportunidade de "descobrir" umas cinco pessoas que foram suas alunas, todas nonagenárias, é claro, debruçamo-nos por centenas de documentos em arquivos de São Paulo e da Entidade que ela fundou a Instituição Beneficente e Instrutiva de São Paulo, visitamos Rezende, sua terra natal, consultamos e nos correspondemos com historiadores locais, foi, enfim, um exaustivo trabalho para reunir informações que estavam muito dispersas, colhendo uma aqui, outra ali, para, então montar o grande "quebra-cabeças", que foi escrever o livro.
Quanto à segunda parte da pergunta, é fato que muitos "valentões do Brás"ou "bêbados do Bexiga" mereceram mais referências de nossos cronistas da época do que Anália, no entanto, a história ainda lhe fará justiça. O fato de ela ser espírita numa época de grande influência clerical, ter sido apoiada pela maçonaria, ser republicana, defender minorias como os negros, tentar reabilitar mulheres decaídas, ser uma mulher com princípios feministas e outras atitudes que tomava, revelando independência, dinamismo e destemor, creio que tudo isso influenciou para que a sociedade da época tivesse tentado apagar seus méritos de mulher fantástica que foi. Como espíritas, sabemos, no entanto, que a recompensa está na sua consciência e não nas homenagens humanas que são fugidias.
GEAE - Conte-nos algo sobre a família e a época de Anália Franco, pois nos parece que ela foi uma pessoa que esteve muito além de seus contemporâneos. Possivelmente não deve ter encontrado muita compreensão na sociedade de São Paulo na virada do século XIX para o XX.
Eduardo - Anália Franco não teve filhos, mas teve dois irmãos que deixaram grande prole e, alguns de seus descendentes tivemos a oportunidade de entrevistar, mas apenas D. Maura Marques Leite cultuava e conhecia alguma coisa de Anália. No desenrolar de sua carreira Anália Franco rompeu barreiras, desprezou preconceitos, desafiou tabus em nome da liberdade de pensamento e do seu docemente tresloucado sonho de ver uma humanidade mais feliz, tornando-a pioneira em várias iniciativas: defendeu o direito da mulher trabalhar fora e desprender-se da tutela do homem, criando cursos para levar adiante sua idéia; defendeu o acesso da criança pobre, até de meninas, à alfabetização; defendeu a alfabetização de adultos; defendeu o acesso da mulher à cultura e intelectualização. Estas e outras teses de emancipação da mulher, que fizeram a fama da feminista das décadas de 60 e 70, já eram defendidas no começo do século por essa mulher que viveu além de seu tempo. Por isso enfrentou muitas dificuldades e incompreensões, o que não diminuiu o seu ritmo de trabalho.
GEAE - Infelizmente o nome de Anália Franco é hoje em dia mais associado ao bairro - por causa do shopping e da faculdade - que a grande Educadora propriamente dita, poucas pessoas conhecem a extensão de sua obra, mesmo no meio espírita. A propósito, como foi que ela se tornou espírita?
Eduardo - Infelizmente é um fato lamentável que seu nome esteja ligado ao nome de um bairro sem que as pessoas saibam a grande mulher que foi. Aos poucos, será inevitável que ela seja reconhecida e estudada sua obra, ocupando o lugar que merece na História. Como espíritas sabemos que não devemos cultuar idolatria às pessoas, mas trata-se de reconhecer seus méritos de grande filantropa e educadora.
Não conseguimos saber ao certo como ela se tornou espírita, mas imaginamos que deva ter sido no episódio da cura de uma cegueira que ela teve por dois anos.
Coincidentemente (ou não) quem ler a biografia de outra grande espírita e sua contemporânea, a espanhola Amália Domingo y Soler, verá que ela também se curou da cegueira por interferência espiritual, iniciando aí sua grande missão de divulgadora do Espiritismo.
GEAE - Ao ler seu livro sobre Anália Franco, nos chamou muito a atenção o fato dela ter sido uma educadora, tal qual foi Allan Kardec, Eurípedes Barsanulfo e Vinicius. Há relação entre a atividade de Anália Franco e sua adesão ao Espiritismo? Até que ponto o Espiritismo influenciou sua atividade como educadora ou sua atividade como educadora influenciou sua vivência da Doutrina Espírita?
Eduardo - Minha intuição me diz que todos foram espíritos preparados nas Escolas do Outro Plano com uma mesma concepção da necessidade de desenvolver na Terra a missão de educar a criança para formar o cidadão de caráter e espiritualizado, contribuindo assim para a elevação do padrão vibratório da humanidade. Podemos acrescentar muitos outros nessa lista: Jerônimo Ribeiro, Thomaz Novelino, Herculano Pires, Leopoldo Machado... a lista é longa.
GEAE - Bezerra de Menezes, Eurípedes Barsanulfo, Batuíra e Vinicius são praticamente contemporâneos de Anália Franco. Ocorreu influência deles na obra de Anália Franco ou dela sobre eles?
Eduardo - No que tenho conhecimento, Batuíra e Anália eram bastantes amigos e, naturalmente, trocavam muitas idéias e se visitavam entre si. Quanto aos demais, também acredito que possa ter havido contato entre eles e mútua influência, por que, à época, os espíritas eram poucos e muito unidos. Basta se ver que os jornais de Batuíra, Anália, o Reformador da FEB, traziam notícias e reproduções de artigos entre si. Apenas Bezerra, que desencarnou em 1900 não deve ter tido muito contato com os demais citados. Cairbar Schutel também carteava muito com Eurípedes e lhe pedia receitas para seus doentes.
GEAE - Considerando o estilo de ensino de Anália Franco, principalmente a orientação que imprimia à Instituição que dirigia e às suas professoras, em que ele diferia do ensino ministrado em outras Instituições da época?
Eduardo - A liberdade de pensamento. Anália dava noções cristãs a seus alunos sem lhes obrigar a seguir o Espiritismo. A maioria das outras Escolas, de orientação católica ou protestante, forçavam a criança a seguir suas religiões. Nas suas Instituições benemerentes, Anália não perguntava a que religião o assistido pertencia,acolhendo a todos.
GEAE - Caso comparemos o estilo de ensino das instituições dirigidas por Anália Franco com o aplicado nas escolas modernas, quais seriam as maiores diferenças?
Eduardo - Naturalmente que a Pedagogia progrediu muito e novas teorias meritórias surgiram, porém o método pestaloziano utilizado por Anália e adaptado às condições brasileiras por Anália nunca foi ultrapassado.
GEAE - No livro você fala do grande apoio que a Maçonaria deu ao trabalho realizado por Anália Franco. Poderia nos falar um pouco sobre esta questão? Gostaríamos de aproveitar e perguntar: como a Maçonaria vê o Espiritismo e seu relacionamento com ele?
Eduardo - No começo do século XX, a obrigação de todo maçom e Lojas maçônicas de trabalharem pela educação do povo era levada tão a sério, que esta obrigatoriedade constava de sua própria Constituição. O maçom, no entanto, cultor da liberdade de pensamento, também lutava, em razão disso, pela laicidade do ensino e a separação do Estado e da Igreja, daí a aproximação com Anália, uma das poucas educadoras da época que tinha o mesmo pensamento a respeito e afinidades de princípios. Não consegui confirmar documentalmente, mas acredito que o esposo de Anália, Francisco Bastos tenha sido maçom.
A Maçonaria vê o Espiritismo como vê todas as religiões que não cerceiem a liberdade de pensamento de seus profitentes: aceitando e sendo tolerante com todas. Maçonaria não é religião ao contrário do que muitos pensam, mas uma Escola Iniciativa que pratica rituais de mistérios tão antigos quanto o homem. Para entrar para a Maçonaria são selecionados na sociedade homens de bons princípios, crentes num Ser Superior, e uma das primeiras perguntas que lhe são feitas é se está disposto a respeitar os religiosos de todos os matizes que se tornarão seus Irmãos. A Maçonaria respeita tanto as religiões que para designar Deus escolheu um termo que não fere a crença de ninguém: Grande Arquiteto do Universo.
GEAE - Qual o papel que Francisco Antonio Bastos, marido de Anália Franco, exerceu em sua obra? Qual a razão do tratamento que lhe foi dispensado após a desencarnação de Anália Franco, principalmente seu afastamento das atividades na Colônia Regeneradora D. Romualdo?
Eduardo - Bastos foi o companheiro dedicado e amoroso de Anália, seu braço direito na administração das Instituições criadas por ela e mais do que isso: dava-lhe a devida sustentação espiritual através das sessões no Centro Espírita São Paulo. Infelizmente, após o desencarne da esposa querida, Bastos foi obrigado a deixar a Instituição, pois a nova Diretoria "não achava bem ficar um homem viúvo em meio a tantas meninas". Registre-se que muitas dessas meninas eram filhas adotivas (de papel passado) dele.
GEAE - As Instituições fundadas por Anália Franco ainda existem e ainda mantém os ideais de sua fundadora?
Eduardo - Segundo temos conhecimento, apenas duas das Instituições fundadas por Anália ainda funcionam: a própria Associação transferida para a cidade de Itapetininga-SP e o Lar Anália Franco de Jundiaí, este trabalhando admiravelmente segundo as idéias de sua fundadora. Vale registrar que na cidade de São Manoel-SP, ainda funciona o Lar Anália Franco fundado logo depois do desencarne de Anália por sua seguidora Clélia Rocha e que é uma referência da cidade em relação a bons serviços prestados à comunidade local.
GEAE - Temos noticias de Anália Franco no plano espiritual?
Eduardo - Sabemos que Anália Franco,ao longo da carreira mediúnica de Chico Xavier, psicografou várias mensagens que relacionamos em nosso livro "Anália Franco, a Grande Dama da Educação Brasileira". Este livro está esgotado, mas estaremos lançando uma segunda edição ainda esse ano.
GEAE - Gostaríamos de agradecer-lhe, em nome de todo o grupo, a gentileza da entrevista e pedir-lhe algumas palavras sobre como vê a importância de Anália Franco para a presente geração de Espíritas?
Eduardo - Eu acredito que a maior contribuição que ela nos deixou foi o seu exemplo. Anália foi uma maravilhosa sonhadora e tinha uma visão de futuro que, se nós tivéssemos tido em São Paulo dez mulheres como ela no começo do século XX, tenho a certeza de que os problemas sociais que o Estado enfrenta hoje seriam muito menores e as desigualdades mais amenas. A presente passagem de seu Espírito pela vida terrena deixou um rastro de luz e podemos nos orgulhar de ter tido esta grande mulher na família espírita.
Entrevista publicada em 2003 no Jornal Boletim GEAE.
GEAE - Eduardo, gostaríamos de iniciar a entrevista perguntando-lhe como foi seu contato com a história de Anália Franco. O quê o levou a estudar e publicar um trabalho sobre a vida da grande Educadora?
Eduardo - Trabalhava já com a memória do Espiritismo quando um amigo, Presidente do Núcleo Espírita Anália Franco, da Zona Leste - SP, começou a insistir comigo que iniciasse uma pesquisa sobre a Educadora. Comecei despretenciosamente recolhendo material sobre ela, acabei entrando em sua faixa mental e, depois de 5 anos de pesquisas, o livro saiu. Devo dizer que foi uma pesquisa que me empolgou desde que comecei a penetrar no universo da grande educadora devido à grande personalidade que estava retratando.
GEAE - Em linhas gerais, como se desenvolveu sua pesquisa? Nos parece que Anália Franco não tem tido, por parte do povo de São Paulo, o reconhecimento que merece, principalmente quando se vêem homenagens públicas a personalidades que bem menos fizeram pelo progresso da nação que ela. O fato de Anália Franco ter abraçado a Doutrina Espírita tem algo a ver com este "esquecimento"?
Eduardo - Como disse, foram cinco anos de pesquisa, cerca de trinta viagens pelo interior de São Paulo e Rio de Janeiro "perseguindo" seus rastros, em que tivemos a oportunidade de "descobrir" umas cinco pessoas que foram suas alunas, todas nonagenárias, é claro, debruçamo-nos por centenas de documentos em arquivos de São Paulo e da Entidade que ela fundou a Instituição Beneficente e Instrutiva de São Paulo, visitamos Rezende, sua terra natal, consultamos e nos correspondemos com historiadores locais, foi, enfim, um exaustivo trabalho para reunir informações que estavam muito dispersas, colhendo uma aqui, outra ali, para, então montar o grande "quebra-cabeças", que foi escrever o livro.
Quanto à segunda parte da pergunta, é fato que muitos "valentões do Brás"ou "bêbados do Bexiga" mereceram mais referências de nossos cronistas da época do que Anália, no entanto, a história ainda lhe fará justiça. O fato de ela ser espírita numa época de grande influência clerical, ter sido apoiada pela maçonaria, ser republicana, defender minorias como os negros, tentar reabilitar mulheres decaídas, ser uma mulher com princípios feministas e outras atitudes que tomava, revelando independência, dinamismo e destemor, creio que tudo isso influenciou para que a sociedade da época tivesse tentado apagar seus méritos de mulher fantástica que foi. Como espíritas, sabemos, no entanto, que a recompensa está na sua consciência e não nas homenagens humanas que são fugidias.
GEAE - Conte-nos algo sobre a família e a época de Anália Franco, pois nos parece que ela foi uma pessoa que esteve muito além de seus contemporâneos. Possivelmente não deve ter encontrado muita compreensão na sociedade de São Paulo na virada do século XIX para o XX.
Eduardo - Anália Franco não teve filhos, mas teve dois irmãos que deixaram grande prole e, alguns de seus descendentes tivemos a oportunidade de entrevistar, mas apenas D. Maura Marques Leite cultuava e conhecia alguma coisa de Anália. No desenrolar de sua carreira Anália Franco rompeu barreiras, desprezou preconceitos, desafiou tabus em nome da liberdade de pensamento e do seu docemente tresloucado sonho de ver uma humanidade mais feliz, tornando-a pioneira em várias iniciativas: defendeu o direito da mulher trabalhar fora e desprender-se da tutela do homem, criando cursos para levar adiante sua idéia; defendeu o acesso da criança pobre, até de meninas, à alfabetização; defendeu a alfabetização de adultos; defendeu o acesso da mulher à cultura e intelectualização. Estas e outras teses de emancipação da mulher, que fizeram a fama da feminista das décadas de 60 e 70, já eram defendidas no começo do século por essa mulher que viveu além de seu tempo. Por isso enfrentou muitas dificuldades e incompreensões, o que não diminuiu o seu ritmo de trabalho.
GEAE - Infelizmente o nome de Anália Franco é hoje em dia mais associado ao bairro - por causa do shopping e da faculdade - que a grande Educadora propriamente dita, poucas pessoas conhecem a extensão de sua obra, mesmo no meio espírita. A propósito, como foi que ela se tornou espírita?
Eduardo - Infelizmente é um fato lamentável que seu nome esteja ligado ao nome de um bairro sem que as pessoas saibam a grande mulher que foi. Aos poucos, será inevitável que ela seja reconhecida e estudada sua obra, ocupando o lugar que merece na História. Como espíritas sabemos que não devemos cultuar idolatria às pessoas, mas trata-se de reconhecer seus méritos de grande filantropa e educadora.
Não conseguimos saber ao certo como ela se tornou espírita, mas imaginamos que deva ter sido no episódio da cura de uma cegueira que ela teve por dois anos.
Coincidentemente (ou não) quem ler a biografia de outra grande espírita e sua contemporânea, a espanhola Amália Domingo y Soler, verá que ela também se curou da cegueira por interferência espiritual, iniciando aí sua grande missão de divulgadora do Espiritismo.
GEAE - Ao ler seu livro sobre Anália Franco, nos chamou muito a atenção o fato dela ter sido uma educadora, tal qual foi Allan Kardec, Eurípedes Barsanulfo e Vinicius. Há relação entre a atividade de Anália Franco e sua adesão ao Espiritismo? Até que ponto o Espiritismo influenciou sua atividade como educadora ou sua atividade como educadora influenciou sua vivência da Doutrina Espírita?
Eduardo - Minha intuição me diz que todos foram espíritos preparados nas Escolas do Outro Plano com uma mesma concepção da necessidade de desenvolver na Terra a missão de educar a criança para formar o cidadão de caráter e espiritualizado, contribuindo assim para a elevação do padrão vibratório da humanidade. Podemos acrescentar muitos outros nessa lista: Jerônimo Ribeiro, Thomaz Novelino, Herculano Pires, Leopoldo Machado... a lista é longa.
GEAE - Bezerra de Menezes, Eurípedes Barsanulfo, Batuíra e Vinicius são praticamente contemporâneos de Anália Franco. Ocorreu influência deles na obra de Anália Franco ou dela sobre eles?
Eduardo - No que tenho conhecimento, Batuíra e Anália eram bastantes amigos e, naturalmente, trocavam muitas idéias e se visitavam entre si. Quanto aos demais, também acredito que possa ter havido contato entre eles e mútua influência, por que, à época, os espíritas eram poucos e muito unidos. Basta se ver que os jornais de Batuíra, Anália, o Reformador da FEB, traziam notícias e reproduções de artigos entre si. Apenas Bezerra, que desencarnou em 1900 não deve ter tido muito contato com os demais citados. Cairbar Schutel também carteava muito com Eurípedes e lhe pedia receitas para seus doentes.
GEAE - Considerando o estilo de ensino de Anália Franco, principalmente a orientação que imprimia à Instituição que dirigia e às suas professoras, em que ele diferia do ensino ministrado em outras Instituições da época?
Eduardo - A liberdade de pensamento. Anália dava noções cristãs a seus alunos sem lhes obrigar a seguir o Espiritismo. A maioria das outras Escolas, de orientação católica ou protestante, forçavam a criança a seguir suas religiões. Nas suas Instituições benemerentes, Anália não perguntava a que religião o assistido pertencia,acolhendo a todos.
GEAE - Caso comparemos o estilo de ensino das instituições dirigidas por Anália Franco com o aplicado nas escolas modernas, quais seriam as maiores diferenças?
Eduardo - Naturalmente que a Pedagogia progrediu muito e novas teorias meritórias surgiram, porém o método pestaloziano utilizado por Anália e adaptado às condições brasileiras por Anália nunca foi ultrapassado.
GEAE - No livro você fala do grande apoio que a Maçonaria deu ao trabalho realizado por Anália Franco. Poderia nos falar um pouco sobre esta questão? Gostaríamos de aproveitar e perguntar: como a Maçonaria vê o Espiritismo e seu relacionamento com ele?
Eduardo - No começo do século XX, a obrigação de todo maçom e Lojas maçônicas de trabalharem pela educação do povo era levada tão a sério, que esta obrigatoriedade constava de sua própria Constituição. O maçom, no entanto, cultor da liberdade de pensamento, também lutava, em razão disso, pela laicidade do ensino e a separação do Estado e da Igreja, daí a aproximação com Anália, uma das poucas educadoras da época que tinha o mesmo pensamento a respeito e afinidades de princípios. Não consegui confirmar documentalmente, mas acredito que o esposo de Anália, Francisco Bastos tenha sido maçom.
A Maçonaria vê o Espiritismo como vê todas as religiões que não cerceiem a liberdade de pensamento de seus profitentes: aceitando e sendo tolerante com todas. Maçonaria não é religião ao contrário do que muitos pensam, mas uma Escola Iniciativa que pratica rituais de mistérios tão antigos quanto o homem. Para entrar para a Maçonaria são selecionados na sociedade homens de bons princípios, crentes num Ser Superior, e uma das primeiras perguntas que lhe são feitas é se está disposto a respeitar os religiosos de todos os matizes que se tornarão seus Irmãos. A Maçonaria respeita tanto as religiões que para designar Deus escolheu um termo que não fere a crença de ninguém: Grande Arquiteto do Universo.
GEAE - Qual o papel que Francisco Antonio Bastos, marido de Anália Franco, exerceu em sua obra? Qual a razão do tratamento que lhe foi dispensado após a desencarnação de Anália Franco, principalmente seu afastamento das atividades na Colônia Regeneradora D. Romualdo?
Eduardo - Bastos foi o companheiro dedicado e amoroso de Anália, seu braço direito na administração das Instituições criadas por ela e mais do que isso: dava-lhe a devida sustentação espiritual através das sessões no Centro Espírita São Paulo. Infelizmente, após o desencarne da esposa querida, Bastos foi obrigado a deixar a Instituição, pois a nova Diretoria "não achava bem ficar um homem viúvo em meio a tantas meninas". Registre-se que muitas dessas meninas eram filhas adotivas (de papel passado) dele.
GEAE - As Instituições fundadas por Anália Franco ainda existem e ainda mantém os ideais de sua fundadora?
Eduardo - Segundo temos conhecimento, apenas duas das Instituições fundadas por Anália ainda funcionam: a própria Associação transferida para a cidade de Itapetininga-SP e o Lar Anália Franco de Jundiaí, este trabalhando admiravelmente segundo as idéias de sua fundadora. Vale registrar que na cidade de São Manoel-SP, ainda funciona o Lar Anália Franco fundado logo depois do desencarne de Anália por sua seguidora Clélia Rocha e que é uma referência da cidade em relação a bons serviços prestados à comunidade local.
GEAE - Temos noticias de Anália Franco no plano espiritual?
Eduardo - Sabemos que Anália Franco,ao longo da carreira mediúnica de Chico Xavier, psicografou várias mensagens que relacionamos em nosso livro "Anália Franco, a Grande Dama da Educação Brasileira". Este livro está esgotado, mas estaremos lançando uma segunda edição ainda esse ano.
GEAE - Gostaríamos de agradecer-lhe, em nome de todo o grupo, a gentileza da entrevista e pedir-lhe algumas palavras sobre como vê a importância de Anália Franco para a presente geração de Espíritas?
Eduardo - Eu acredito que a maior contribuição que ela nos deixou foi o seu exemplo. Anália foi uma maravilhosa sonhadora e tinha uma visão de futuro que, se nós tivéssemos tido em São Paulo dez mulheres como ela no começo do século XX, tenho a certeza de que os problemas sociais que o Estado enfrenta hoje seriam muito menores e as desigualdades mais amenas. A presente passagem de seu Espírito pela vida terrena deixou um rastro de luz e podemos nos orgulhar de ter tido esta grande mulher na família espírita.
Entrevista publicada em 2003 no Jornal Boletim GEAE.
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