segunda-feira, 4 de outubro de 2021

A Parábola do Semeador e o solo fértil

 


Por Angélica dos Santos Simone

Para que a reforma íntima seja completa, a etapa seguinte refere-se ao descanso da terra, pois todo solo necessita do pousio. Como nada na natureza é passível de eterna movimentação, tudo que existe, esteja ou não em processo de configuração, de transformação ou de criação, necessita de um momento de calmaria para que as partículas aquietem-se, tranquilizem-se para se preocuparem somente em assimilarem todo este processo.

Estamos sensíveis e temos esparadrapos por todo o corpo, o coração está inquieto, mas aliviado, apenas necessita de silêncio. Precisamos, em dados momentos de nossas vidas, de paz, de tranquilidade, reduzir a velocidade, manter-se em silêncio. Isso não significa que me ausentarei de meus compromissos e de minhas atividades diárias, somos seres em constante atividade (lembremo-nos do pensamento), é difícil não pensar. Quando o lavrador cumpriu a sua parte, quando completou todas as etapas incumbidas a ele no preparo da terra, ela carece então, do devido descanso para receber as sementes que virão.

Recordaremos que tal processo não é uma reta ascendente, pois diante de toda decisão, mudança e aprendizado, eu devo disciplinar a mansidão de meu Espírito para que ele esteja sempre em paz. Só alcançarei a paz em mim se eu me disciplinar na postura diária de análise de minha conduta mental.

Um terreno humilde (aquele que contém húmus, adubo) poderá receber as sementes que se desenvolverão, pois ele possui os elementos exigidos para tal fase. Quando nos encontramos em meio a uma tempestade, não é possível enxergarmos o que está à nossa frente, assim, é nossa função nos acalmarmos e termos paciência em aguardar as nuvens dissiparem-se e então podermos observar o que nos é mostrado.

Da mesma maneira acontece com o terreno. O seu estado de agitação é resultado de um incômodo gerado por uma reação àquilo que não queremos aceitar ou que não queremos corrigir em nós, em outras palavras, é resultado do Orgulho. O orgulho apresenta-se latente em nós, perceptível somente quando as situações nos envolvem e quando, através da ansiedade, manifestamos as nossas opiniões irrevogáveis. Como não nos conhecemos, não consentimos que nós sejamos seres orgulhosos, mesmo que em baixo grau, mas a sua existência é suficiente para defini-lo. É necessário humildade para admitir o nosso orgulho.

Diante das experiências, o homem orgulhoso produz uma movimentação energética sempre que suas afirmações são questionadas. Certa feita, um aprendiz perguntou a Gandhi quantas vezes ele havia perdoado em sua vida, ao que Gandhi respondeu:

- Nenhuma!

Esta resposta foi uma surpresa para o seu seguidor. Gandhi, compreendendo a reação de seu interlocutor, explicou:

– Nunca me senti ofendido, por isso nunca senti a necessidade de perdoar.

Como um terreno fértil, Gandhi não se sentiu ofendido, ou seja, a sua paz não foi afetada pelas forças externas dirigidas a ele. Algo semelhante ocorreria se as águas de um lago não formassem ondas quando atirássemos alguma pedra em sua superfície.

A emoção é resultado ou produto do orgulho. Por conta disso, ela se mostra confusa, transitória, intensa, mutável e incômoda, donde advém um mal-estar, pois sempre surge a ansiedade. Uma força causou a perturbação no meio; se este meio fosse possuidor de alguns atributos, tal perturbação geraria uma resposta diferente, o lago teria a capacidade de lapidar a pedra arremessada, respondendo com um lindo cristal.

Somos reatores nucleares, reagimos em intensidade e em proporção às forças que nos perturbam, geramos emoções que são capazes de destruir o nosso sistema orgânico e mental e não nos atentamos para esses detalhes que fazem parte de nosso cotidiano, de dia em dia os anos podem ser fatigantes.

Quando alcançarmos a compreensão do “ser humilde” e para isso é necessário o conhecimento, saberemos que a única maneira de neutralizar as reações será produzindo (e não re-produzir) Amor. Esta produção inicial será utilizada para resguardar o nosso organismo físico e mental e gerar uma capa protetora em volta de nosso campo energético, de modo que qualquer emanação imprópria direcionada ou assimilada por nós, não nos afetará. Lembremos que o amor é uma força capaz de dissolver qualquer construção contrária à proposta de Deus para nossas vidas.

Após cuidarmos de nosso templo, o amor produzido será emanado, transmitido para outrem, pois assim ocorre quando utilizamos a enxada em nosso terreno e encontramos uma pedra preciosa. O avarento deixá-la-á enterrada ou escondê-la-á em qualquer outro lugar, mas o humilde vai trazê-la para a superfície e compartilhá-la-á com todos. O amor é esta pedra preciosa.

Durante o pousio, o nosso solo está assimilando tudo que foi feito nele e preservando os elementos necessários e dispondo-os de modo que a semente se sinta aconchegada quando for lançada pelo semeador. Desta maneira age o amor em nosso interior; ele organiza cada elemento orgânico e mental com o intuito de que ambos trabalhem na fertilidade constante do solo e para que ele sempre esteja pronto nos momentos de enfrentamento das intempéries que o atingirão enquanto ocorre a germinação. O semeador passará uma vez, arremessará a sua melhor semente, retornará depois de um tempo para ver como está o canteiro e reclamará ao lavrador se algo provocar o comprometimento de uma colheita saudável. Lembrará ao lavrador que, cada vez que ele vier semear, o solo deve estar adequado para receber sementes diferentes, pois cada semente exige os recursos e elementos apropriados para sua germinação.

Cada ensinamento transmitido por Jesus só é aproveitado pelos Espíritos que se propõem a manter constante vigília de seus pensamentos e atos, cultivando o amor e a prece para se protegerem contra as intempéries e ervas daninhas, mantendo a fé na evolução e regando a humildade para que sua árvore possa oferecer deliciosos frutos!

Angélica dos Santos Simone é geógrafa e mestranda em Geografia Física pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. É diretora de ‘Arte e Cultura Espirituais’ do Grupo Espírita União das Fraternidades para uma Nova Aliança (www.nova-alianca.org) em São Paulo.

 

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