segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Poder do Pensamento

A Arte de Pensar


O célebre filósofo pessimista alemão, Schopenhauer, teve ocasião de definir o homem como sendo o animal que tem a funesta mania de pensar. A frase atormentada de Schopenhauer, evidentemente se refere ao homem que se levanta através do pensamento para fomentar a miséria, para desenvolver a guerra, para praticar os atos hediondos contra a humanidade. Se não tivessem existido aqueles heróis dos ideais, os mártires da ciência, os grandes filósofos, os idealistas, os artistas e os santos, cujas vidas são evangelhos de feitos, esta matéria demonstraria que Schopenhauer estava equivocado, porque a arte de pensar, a grande conquista do pensamento, é um dos atributos mais belos do processo antropológico, sociológico e psicológico do ser.

Atingimos nesse momento a uma das glórias da evolução, a etapa do pensamento lógico, que nos permite viajar através da cibernética, da biônica, utilizando-nos dos mais avançados recursos da eletrônica para nos situarmos neste arquipélago de estrelas e também da causalidade e a finalidade da vida.

Desejando interpretar essa realidade do ser humano, Goécio, o admirável filósofo da decadência romana, dos séculos V e VI, estabeleceu que a criatura humana é um animal bípede dominado pelo instinto gregário de conservação da vida, entre outros, com a extraordinária capacidade de pensar. E esta capacidade de pensar sempre interessou aos filósofos idealistas, que tentaram encontrar a base do pensamento em uma realidade de natureza extracorpórea, por chegarem à conclusão de que o cérebro por si mesmo era incapaz de elaborar a ordem das ideias.

Foi Aristóteles quem teve a coragem de tentar interpretar as leis do pensamento, para equacionar a arte de discernir e estabeleceu, por meio do estudo das associações, quatro leis fundamentais que seriam capazes de explicar o mecanismo da mente: as manifestações da verbalização e as técnicas da comunicação escrita. Mas, mesmo através da colaboração de Aristóteles encontramo-nos diante de efeitos, que as leis de associações, de espontaneidade, de continuidade, dos semelhantes, dos contrastes, procuram dar uma coordenação para as bases da lógica. Em um trabalho extraordinário, que é Evolução em Dois Mundos, através da mediunidade de Francisco Candido Xavier, o admirável espírito André Luiz estabelece que a forma corporal, consequência inevitável do corpo espiritual, por sua vez resultado do fator da mente, exterioriza no mundo das manifestações a realidade psíquica, que se vai desdobrar no mecanismo do pensamento.

Mira y Lopez, o grandioso psicólogo espanhol, fazendo uma análise desta realidade que é o ser pensante, estabelece que houve uma evolução, através de atavismos que se transformavam em realidades lógicas.

Até que o homem atingisse o estado de plenitude, agimos por conta própria. Que a contribuição extraordinária de Mira y Lopez vai ensejar-nos uma conquista etapa a etapa, patamar a patamar, sem que aqueles ascendentes anulem os que se encontrem como base ancestral, que serviria para Carl Gustav Jung como sendo a estrutura do arquétipo em nossa realidade do inconsciente coletivo, do inconsciente profundo para definir a realidade estrutural do ser humano racional.

Estabeleceu Mira y Lopez que a primeira manifestação do pensamento foi de natureza primitiva, quando o ser que se estava desdobrando no período Pithecantropus Erectus, impossibilitado de pensar, exteriorizava as suas manifestações de natureza sócio-motora, sensório-motora, primitiva, instintiva. Não dispondo do discernimento, aquele ser Pithecantropus Erectus, através da emissão de grunhidos, teve a necessidade do instinto preservador da vida. Começou a ter o que seriam os primeiros lampejos da ideação futura. É nesse período, que refugiado da caverna, ele tem da vida, as ideias apenas fisiológicas: a função de comer, de dormir, de co-criar; e logo depois, guiado pelo instinto de conservação, de defender-se. A caverna representa-lhe o habitat de segurança, para que ele possa desenvolver a manifestação de uma vida instintiva, natural, mecânica, automatista.

Assevera Mira y Lopez que a evolução é inalienável patrimônio da vida e este ser automaticamente passa ao segundo patamar da área do pensamento: o pensamento pré-mágico. É uma manifestação atávica e que ele na realidade não sabe exteriorizar aquilo que está dentro d’alma no turbilhão, mas que os antropólogos afirmam, a percepção de que a vida é valiosa e graças ao “insite” da sobrevivência, ele abandona a furna e vai viver na palafita ou na floresta, onde ele dispõe de uma área mais ampla, não somente para viver, mas também para defender-se dos adversários naturais. Ele observa agora a terra, as florestas imensas, as erupções vulcânicas, os terremotos, os maremotos, as calamidades sísmicas, as chuvas torrenciais, as feras e brota nele um sentimento de submissão. As forças ignotas da natureza, sendo essa a primeira manifestação de culto pelo temor, para poder preservar a existência. Nesse período do pensamento pré-mágico ocorre de que a vida para sobreviver mata e a criatura humana é resultado da morte de outras expressões de vida, na alimentação, na defesa da sua individualidade e advém a ideia de prestar culto bárbaro a essas forças ignotas que ele pensa aplacar através dos holocaustos de vidas humanas. Nesse período pré-mágico ocorre-lhe a possibilidade de uma vida depois da vida, que certamente a fenomenologia mediúnica se encarrega de oferecer-lhe subsídios e os primeiros fatores probantes da sobrevivência.

O progresso continua e ele passa ao terceiro período do pensamento: é o período mágico, que na criança corresponde à faixa etária dos dois aos três anos e que ele através do instinto, da imaginação e do seu próprio âmbito de movimento começa a descobrir necessidades estéticas ainda em uma fase de magia, que será interpretada através da policromia da natureza e por meio dos primeiros arquétipos e que surge a divindade, agora incompreensível, exteriorizada no politeísmo, na manifestação dos numes tutelares, dos deuses lares, das forças que devem ser diligenciadas através de novos holocaustos para o protegerem, para o amarem, para dilatarem-lhe a vida na face da Terra. Surge então, a mitologia. A mitologia ainda bárbara, a mitologia de Baal ou a mitologia pré-grega; a mitologia do norte da África, do Oriente Médio ou das montanhas imensas do Himalaia ou das regiões das margens dos grandes rios prenunciando o período agrário.

O Ganges, o Nilo, o Tigre, o Eufrates, o Yang-Tsé-Yang, oferecendo-lhe agora uma expressão maior de territórios e ele passa para o quarto período do pensamento. É o pensamento egocêntrico. Já se lhe desenvolveu a faculdade da sobrevivência, ele tem necessidade de dar continuidade à vida. É o ser fisio-psicológico, já consegue oferecer a realidade de um mundo metafísico. Através das ideias nasce uma filosofia empírica, mas ele sente necessidade natural de vencer aqueles que lhe feriam; adversários comuns alargam seus horizontes e pelo mesmo instinto de preservação da vida ele vai para a lei de destruição e conquista as outras tribos, as outras tabas, vai contra as nações e em breve alarga-se pelo Mar Mediterrâneo para poder desenvolver a sua capacidade de valores. Este pensamento de ordem egocêntrica está representado como atavismo na criança entre os três até os seis anos de idade. Mas é nessa hora que seus lampejos, agora não mais “insites”, resultado de elaboração mental, atinge um patamar superior e ele adquire o pensamento lógico.

Asseveram os psicólogos que esse pensamento lógico teria sido adquirido entre os gregos, na Hélade, com o que não concorda Mira y Lopez, isto porque se apenas os gregos houvessem logrado o pensamento de natureza lógica, as grandes civilizações da Antiguidade oriental estariam detidas no pensamento atávico do egocentrismo, o que não corresponde à realidade. Mas, a grande verdade é que a Grécia logra o pensamento lógico e toda sua policromia religiosa é feita de estesia. A sua filosofia agora apoia-se na base da poesia, da retórica, da lógica, oferecendo numa visão de pensamento filosófico - a velha dualidade do bem e do mal – que são os atavismos do primarismo e, ao mesmo tempo, as perspectivas do fatalismo. É o “ghost” do amanha nele embutido e é o diabo das experiências primeiras, atormentadas, de que ele ainda não se logrou libertar. Neste momento do pensamento lógico, ele transfere a razão para Roma e, do pequeno espaço do Lácio, as tropas e as legiões agigantam-se, conquistam a península Itálica. Depois, invadem o mar Tirreno, o Egeu; o Mediterrâneo tomba e Roma coloca a sua águia dominadora em todas as partes da civilização terrestre.

Neste momento de grandeza ilógica, ressumam as manifestações do pensamento egocêntrico, existe o mundo porque existe Roma; existe o pudor porque César é divino, é a personificação da divindade, é deus; mesmo morto ele permanecerá como a gloria do Império ou a glória da república, mas a necessidade de evoluir agiganta-se e Mira y Lopez propõe o sexto nível no patamar de pensamento: é o nível do pensamento intuitivo, que somente se pode lograr quando se desenvolvem as percepções de ordem parafísica. Em alguns, de maneira espontânea, como em Beethoven, que muitas vezes conseguia compor tendo no mundo intimo integral, a partitura da obra que ainda ia escrever; ou como Voltaire, ao escrever um dos cantos do Henríada, asseveraria depois que houvera feito enquanto dormia, enquanto sonhava; ou Daudet, nas Cartas do seu moinho, aquele mesmo eterno apaixonado das cartas à Julia; ou como Tartinni, na sua bela obra “A Sinfonia ao Diabo”; ou como Condorcet, que asseverava haver equacionado vários problemas de matemática enquanto dormia, enquanto sonhava; ou como São João Crisóstomo, interpretando as epistolas Paulinas, no começo do Cristianismo, era assessorado pelo apóstolo das gentes, que o inspirava; ou Teresa D’Ávila, no monastério, dominada pelo artritismo e nos momentos da confissão flutuando diante dos olhos atentos de São João da Cruz, em um estado de natureza transcendental, erguidos da Terra, em admirável fenômeno de natureza anímica, superando a densidade gravitacional do globo, em êxtase.

Quando a figura cândida de Francesco Bernardoni, dobrado sobre as águas de Spoleto, escutando a voz inesquecível de Jesus: “Vai, Francesco e ergue a minha igreja que está em ruínas.” Ele parte para Assis e vê a igreja de São Damiano em ruínas físicas, começa a carregar pedras, levanta o templo de pedra e de cal, e quando esse vai ser oferecido ao Senhor, a mesma Voz lhe diz: “Não é esse templo, Francesco. É o templo moral. Não é essa igreja. É a igreja moral, a igreja do espírito.” Ele se levanta dali e se transforma em “Il trovatori di Dio”. Sai para ser o cantor da Era Nova, aquele servo de Jesus, o mais perfeito símile de Jesus Cristo. Nesse nível de pensamento, que o doutor Robert D. Hope, um dos pais da ontologia cerebral americana, dirá que é o quinto nível de consciência: a consciência que se vincula a realidade cósmica e de que somente alguns raros homens e mulheres são portadores, está no mesmo nível do pensamento de natureza intuitiva.

Fazendo uma análise desta evolução do pensamento, somos dirigidos a recordar-nos de Allan Kardec, da realização do pensamento espírita, da Codificação que lhe guarda o nome, em justa homenagem ao seu labor, a Codificação Kardequiana. Ao nos recordarmos desse homem de pensamento lógico, esse homem racional, que de um momento para outro atinge também o pensamento intuitivo, tendo a visão da realidade do futuro, como colocará em rodapé , nos comentários das suas recordações dos dez anos após o lançamento de “O Livro dos Espíritos”; na análise que faz das dores que experimentou; das ingratidões que recebeu; das bordoadas das almas impiedosas que lhe maceraram a alma; dos beijos que se converteram em dentadas na face; inclusive na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas ele sorri e diz: “Tudo isto o Espírito de Verdade me havia anunciado! Mas, ele não me disse das alegrias, das emoções que eu experimentaria em ver a doutrina espírita crescer e consolar milhões de almas. Quando as minhas dores eram mais acerbas, quando as minhas dificuldades eram mais cruéis, eu me erguia acima da humanidade através da oração e de lá, eu podia ver o futuro que me estava reservado e o futuro da causa que havia abraçado com abnegação.”

Acompanhamos a tecnologia e admitimos a ideia de Schopenhauer; e vemos neste século, o holocausto da Iugoslávia; tivemos ocasião de ver, a pouco, o holocausto da Chechênia; experimentar o horror das cartas-bombas, mandadas por fanáticos ou da estupidez de determinadas áreas fanáticas desejando levar o pavor a Paris, a cidade-modelo do mundo, onde a arte, a beleza, a sabedoria e a ciência dão-se as mãos e onde brotou a árvore do Evangelho a 18 de abril de 1857.

É ainda o período de Schopenhauer, mas ao Espiritismo cumpre a tarefa de apressar essa hora, para que ajudemos a transformação desses fatores que retardam a marcha do progresso. Allan Kardec, preocupado com a questão, perguntou às entidades venerandas, qual era a razão da guerra e esses espíritos admiráveis, na questão 742 de “O Livro dos Espíritos”, responderam: “Predominância da natureza animal sobre a natureza espiritual do homem e transbordamento das paixões.” Período de pensamento egocêntrico. Ainda há predominância dos atavismos das faixas primárias em detrimento das aspirações superiores dos patamares que o homem vai galgar. E que pretende, pois, com a guerra? Acelerar o progresso. Parece paradoxal. Através da guerra acelera-se o progresso nas condições primitivas, nas condições da barbárie, porque o homem, sob o flagror da guerra, sonha com a paz, desenvolve a ciência, acelera a tecnologia e, quando vem a paz, descuida-se. E aqueles valores, antes bélicos, são aplicados no conforto, na comodidade, até a erupção de uma nova guerra. Chega, porém, o momento em que iremos promover o progresso, não através da guerra, senão, através da paz.

Foi no dia 13 de junho do ano de 313, em Milão, que o Cristianismo soçobrou, quando Constantino, depois da vitória, na fonte Nízia, transformou a doutrina do amor em doutrina do Estado. Foi a partir dali que o pensamento grandioso de Jesus começou a emurchecer, como diria Santo Eusébio. Na hora em que diminui o holocausto, também diminui o ardor; na hora em que o sacrifício desaparece, os valores éticos, morais, eles se debilitam e fenecem com os interesses abastardados das paixões humanas. A partir daquela data, a doutrina que era de perseguidos, passou a ser uma doutrina de perseguidores, culminando nos atos hediondos da Inquisição, de que a América Latina foi uma das grandes vitimas, quando teve os seus silvícolas praticamente dizimados, como aconteceu na Colômbia; qual aconteceu nas terras da grande Cordilheira dos Andes e não tanto aqui, graças à presença soberana de José de Anchieta, Manoel da Nóbrega, Auzpicueta Navarro, que tomaram a defesa do hotentote, do homem primitivo para colocar-lhe na alma a doçura de Jesus.

O Espiritismo cresce e jamais sentará ao lado das mesas dos poderosos para firmar a paz de fora, porque a sua mensagem é da transformação da criatura humana para melhor, que irá mimetizar a criatura próxima e aquela que esteja mais perto, até que o grupo social, beneficiado transforme-se e a sociedade experimente as bênçãos da conquista. Mas como poderá o Espiritismo promover o progresso, acelerar as transformações que tardam? A ciência nos deu a grande horizontal das conquistas tecnológicas, o Espiritismo dar-nos-á a grande vertical da conquista moral, para que possamos dizer, como Albert Einstein: “O homem que tiver a bomba atômica, se não tiver Deus no coração, destruirá a Terra. Eis, porque - completou o Pai do Concepcionismo – é necessário que a ciência se una a religião, pois se isso não ocorre, ela é capenga; e a religião se ligue à ciência, pois se isso não se der, ela será cega.”


Nenhum comentário:

^