sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Dos Romances Mediúnicos


Muitos dos nossos leitores, ou quase que em geral os espíritas, supõem sejam os romances mediúnicos meros arranjos literários, ficções habilidosas para exposições doutrinárias. Alguns confessam mesmo não se darem ao trabalho de ler tal literatura, visto não se interessarem por obras fictícias. Não sentem nem mesmo a curiosidade, muito razoável, demonstrando zelo pela causa esposada, de observar a arte com que os romancistas espirituais tecem os seus enredos para apresentar a magnificência do Bem, que tais livros tanto exaltam, alheios, como se deixam estar, à relação dos fatos reais da vida de cada dia, que os mesmos livros expõem paralelamente como ensinamento revelado pela Doutrina dos Espíritos.

O Espírito Adolfo Bezerra de Menezes, em certa obra mediúnica a nós concedida (Dramas da Obsessão), classifica os romances espíritas de similares das parábolas messiânicas, visto serem eles extraídos da vida real do homem, enquanto as parábolas. igualmente foram inspiradas ao Divino Mestre pela vida cotidiana dos galileus, dos judeus e de suas azáfamas diárias.

Engana-se, pois, quem julgar os referidos romances histórias ilusórias, simples composições artístico-literárias para fins de propaganda doutrinária. Estamos autorizada a declarar, dada a nossa longa convivência com os mentores espirituais, que, na grande maioria, pelo menos, senão na totalidade, nos romances mediúnicos existe a verdade de vidas humanas como fundamento, senão relatórios ligeiramente alterados a fim de não identificar completamente as personagens. No XXXV capitulo da sua bela obra «Depois da Morte», referindo-se às reallzações concretas do Além-Túmulo, o grande Léon Denis usa desta significativa descrição:

“ Construções aéreas, de cores brilhantes, de zimbórios resplandecentes: circos imensos onde se reúnem em conselho os delegados do Universo; templos de vastas proporções, donde se elevam acordes de uma harmonia divina; quadros variados, luminosos; reproduções de vidas humanas, vidas de fé e de sacrifício, apóstolos dos dolorosos, dramas do Infinito.» E nós mesmo, e também o leitor somos testemunhas de que as «reproduções de vidas humanas» acima citadas já foram ditadas aos médiuns através de visões e da psicografia e os romances da vida real aí estão, na bibliografia espírita, prestando serviços à obra de esclarecimento quanto à conduta que devemos ter, na vida social ou íntima, em face das leis de Deus.

Em «O Céu e o Inferno», de Allan Kardec, no relatório das comunicações das entidades sofredoras que o Codificador analisou, encontraremos temas variados, levantados de ocorrências reais, que poderiam ser transportados para histórias educativas modelares, de sabor espírita, ao passo que o mesmo Denis, em outro livro de sua autoria, relata acontecimentos observados durante experiências espíritas realizadas sob controle científico rigoroso, que permitiriam farto cabedal para histórias e romances fundamentados em acontecimentos reais. Qualquer médium meticuloso e honesto, que amasse os próprios desempenhos mediúnicos com verdadeiro desprendimento, do seu convívio com as individualidades espirituais colheria assuntos dignos de serem transportados para a boa literatura educativa, desde que se estribasse na verdade dos mesmos acontecimentos e não em fantasias do seu subconsciente. E quantas confissões e narrativas de Espíritos sofredores, durante as chamadas sessões práticas, encerram dramas pungentes, muitas vezes impressionantes, cujos exemplos são excelentes para a reeducação das massas?

Comumente, pois, os fatos narrados nos romances mediúnicos são extraidos das próprias vidas planetárias, remotas ou recentes, dos autores espirituais, como sabemos acontecido com as obras «Há dois mil anos... »e «Cinquenta anos depois», concedidas pela entidade instrutora Emmanuel ao médium Francisco Cândido Xavier, além de outras da mesma entidade, que ventilam existências de personagens por ela conhecidas no Além. De outras vezes os fatos são extraídos da existência dos pupilos ou amigos espirituais dos autores da obra, como o sucedido ao romance «Amor e Ódio», ditado pelo Espírito Charles; e «Dramas da Obsessão», onde a entidade Dr. Adolfo Bezerra de Menezes descreve as dramáticas peripécias de uma pequena falange de protegidos seus, encarnados e desencarnados, durante trabalhos que, como orientador espiritual de Centros Espíritas, realizou, ao passo que no volume «Nas Voragens do Pecado», a nós também concedido mediúnicamente, vemos a vida do seu autor espiritual, Charles (o Carlos Filipe 2º, da mesma obra), e de criaturas por ele muito amadas na época, ou seja, pelo século 15. E todos sabemos que o mesmo se deu com o Espírito do Conde Rochester, que em vários dos seus livros confiados à médium russa Coudessa Krijanovsky, participa o leitor não só das suas próprias atividades de Espírito em marcha de evolução, mas também da ligação milenar existente entre o seu próprio Espírito e o da médium que o serviu. Também a entidade Padre Germano confia episódios de sua vida terrena à médium espanhola Amália Domingo Soler, confidências que resultaram num dos mais belos e encantadores livros que enriquecem a bibliografia espírita: «Memórias do Padre Germano».

Todos esses luminares do mundo invisível, assim como outras individualidades esclarecidas e igualmente iluminadas são unânimes em repisar que o mundo espiritual é fértil em temas para estudos e análises e que dramas intensos ali são surpreendidos entre as recordações dos seus habitantes, os quais muitas vezes concordam em narrar ao vivo, ou seja, criando cenas sob o poder da mente, suas passadas peripécias planetárias. Sabemos também que os escritores do plano invisível, que concedem obras literárias aos encarnados, se estas são românticas, costumam reunir trechos de uma existência e trechos de outra para uma lição mais completa e lógica, figurando-os como se se tratasse de uma única fase planetária; substituem nomes, deslocam datas e localidades, quase sempre com a finalidade de não identificarem as personagens; ampliam a moral da história, adaptando-a aos ensinamentos evangélico-espíritas, no intuito de dotarem a obra de finalidade educativa; enxertam, frequentemente, noticiário espírita autêntico da época, para fins de propaganda, tal como vemos no conto «O Paralítico de Kiew», à nossa faculdade concedido pelo Espírito Léon Tolstoi, sem, contudo, alterar a essência do caso, na sua construtura veraz, e enfeitam personagens e ambientes transportando-os, algumas vezes, para a aristocracia, concedendo-lhes títulos nobiliárquicos, por não ignorarem que tais detalhes possuem a magia de melhor atrair a atenção do leitor, encantando-o com uma arte toda especial, muito embora algumas personagens fôssem realmente antigas figuras da nobreza. Vale aqui relembrar certas confidências do nosso grande amigo espiritual Camilo Castelo Branco, que, referindo-se à sua obra mediúnica «O Tesouro do Castelo», a nós ditada, afirmava que o Espaço se achava repleto de entidades da categoria moral do «Barão André Januário», personagem central da dita obra, e que ele, Camilo, não tinha necessidade de criar ficções para ditar obras mediúnicas, porque, tanto no Além como na Terra, havia temas verídicos excelentes, à sua disposição. O que lhe faltava eram médiuns que se submetessem às disciplinas necessárias ao certame. Para um literato, portanto, mas principalmente para o literato desencarnado, um ponto de referência, pequeno acontecimento da vida real do cidadão terreno ou da entidade espiritual, bem estudado e analisado, poderá transformar-se em formosa obra educativa espírita, e é o que vemos acontecer com os nossos escritores do Além, que não têm necessidade de inventar os romances que dão aos seus médiuns, porque, vasculhando a sociedade terrena e o mundo invisível, encontrarão acontecimentos dignos de serem imortalizados num livro. As Belas Letras possuem recursos expressivos para, sem se afastar da verdade, apresentar literatura romântica atraente, que poderá ser considerada como biografias de personagens que realmente existiram sobre a Terra, O Espiritismo, cuja missão é influir para renovar, melhorando todos os setores da sociedade, criou uma literatura nova, modelar, e a sua atual bibliografia mostra dignamente o que poderá ele ainda realizar futuramente nesse delicado setor.


Yvonne do Amaral Pereira

Do livro “Recordações da Mediunidade”, trecho do cap.6 “Testemunho”.

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