terça-feira, 24 de março de 2009

Especial: “Dalai Lama: Cooperação entre as Religiões do Mundo”






“As pessoas podem acreditar ou não em uma religião, e podem acreditar ou não no renascimento, mas não há ninguém que não aprecie a benevolência e a compaixão.” (Dalai Lama)



Uma entrevista com o Sr. Tenzin Gyatso, líder religioso do Tibete, considerado no budismo como a encarnação do deus tibetano da compaixão e XIV Dalai Lama que aborda o tema “Cooperação entre as Religiões do Mundo.”:


Como líder religioso, o senhor está interessado em encorajar ativamente os outros a seguir a sua fé? Ou assume a posição de estar disponível para alguém que busque conhecê-la?

- Esta é uma pergunta importante. Não estou interessado em converter pessoas ao budismo, mas em como os budistas podem contribuir para a sociedade humana segundo as nossas próprias idéias. Acredito que os outros tipos de fé religiosa também pensem de modo semelhante, buscando contribuir para um objetivo comum.
Pelo fato de as diferentes religiões terem ocasionalmente discutido entre si em vez de se concentrarem no modo de contribuir para um objetivo comum, nos últimos 20 anos na Índia tenho aproveitado todas as oportunidades para me encontrar com monges cristãos –católicos e protestantes- e também com muçulmanos e judeus e, naturalmente na Índia, com os hindus. encontramo-nos, rezamos juntos, meditamos juntos e discutimos as suas idéias filosóficas, sua forma de abordagem, suas técnicas. Tenho grande interesse nas práticas cristãs, no que podemos aprender e copiar de seu sistema. Da mesma maneira, na teoria budista existem muitos pontos, como as técnicas de meditação, que podem ser praticados na igreja cristã.
Assim como Buda mostrou um exemplo de contentamento, tolerância e do modo de servir os outros sem um propósito egoísta, assim fez Jesus Cristo. Quase todos os grandes mestres viveram uma vida santificada- não luxuosa como a de reis ou imperadores, mas como seres humanos simples. Sua força interior foi tremenda, ilimitada, porém a aparência externa era de contentamento com um modo de vida simples.

Pode haver uma síntese do budismo, judaísmo, cristianismo, hinduísmo e de todas as religiões, reunindo o melhor de cada uma para formar uma religião mundial?

- Formar uma religião mundial é difícil e não é particularmente desejável. Contudo, como o amor é essencial a todas as religiões, podemos falar da religião universal do amor. Quantas técnicas e métodos para desenvolver o amor e também para alcançar a salvação ou a liberação permanente, existem várias diferenças entre as religiões. Portanto, não acho que possamos formar uma filosofia ou uma religião.
Além disso, acredito que as diferenças na fé são úteis. Existe uma riqueza no fato de haver tantas apresentações distintas do caminho. Com tantos tipos diferentes de pessoas com várias predisposições e inclinações, isto é útil.
Ao mesmo tempo, a motivação de todas as práticas religiosas é semelhante- amor, sinceridade, honestidade. O modo de vida de praticamente todos os indivíduos religiosos é o do contentamento. Os ensinamentos da tolerância, do amor e da compaixão são os mesmos. Um objetivo básico é o benefício da humanidade- cada tipo de sistema buscando aperfeiçoar, com a sua maneira particular, os seres humanos.
Se dermos muita ênfase à nossa própria filosofia, religião ou teoria, ficaremos muito ligados a elas e, se tentarmos impo-las às outras pessoas, isto causará problemas. Basicamente todos os grandes mestres, como Gautama Buda, Jesus Cristo ou Maomé, fundaram seus novos ensinamentos com o objetivo de ajudar os seus companheiros humanos. Não tinham como finalidade ganhar alguma coisa para si próprios nem criar mais problemas ou inquietações no mundo.
O mais importante é que nós respeitamos uns aos outros e aprendemos com cada um coisas que enriquecerão a nossa própria prática. Mesmo que todos os sistemas fossem separados, como todos têm o mesmo objetivo, o estudo de cada um deles é muito útil.

Algumas vezes, as comparações das religiões do Oriente com a cultura ocidental fazem o Ocidente parecer mais materialista e menos iluminado do que o Oriente. O senhor sente essa diferença?

-Existem dois tipos de alimento- o alimento para a fome mental e o alimento para a fome física. Uma combinação destes dois- o progresso material e o desenvolvimento espiritual- é o resultado mais prático. Acho que muitos americanos, particularmente os jovens americanos, compreendem que o progresso material sozinho não é a resposta completa para a vida humana. Neste momento, todas as nações orientais estão tentando copiar a tecnologia do Ocidente. Nós orientais, como os tibetanos, como eu mesmo, olhamos para a tecnologia ocidental sentindo que se desenvolvermos progresso material, o nosso povo conseguirá alcançar algum tipo de felicidade permanente. Mas quando vou para a Europa ou para a América do Norte vejo que por baixo dessa superfície bonita ainda existem infelicidade, perturbação mental e inquietude. Isso revela que somente o progresso material não é a resposta completa para os seres humanos.


Entrevista publicada no livro “A Prática da Benevolência e da Compaixão”, Dalai Lama.

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