quinta-feira, 26 de junho de 2008

Destaque: Casa da Flor

Existem pessoas simples, comuns que nem eu e você que escrevem nos livros de suas vidas lições belíssimas. É como se elas estivessem entre nós para nos dizer algo que todos possuímos e podemos fazer, mas que ainda não percebemos. O exemplo desse homem nessa reportagem até parece uma parábola contada por algum sábio que se analisarmos com profundidade perceberemos a metáfora, o grande ensinamento que ele quis nos revelar. (Carlos Pereira)


Casa da Flor


Juntando cacos, Gabriel Joaquim dos Santos criou uma obra de arte e o endereço dele, no litoral norte do Rio, ficou conhecido como a Casa da Flor.
Os degraus largos e irregulares feitos de lasca de pedra e tijolo sugerem um andar tranqüilo. O homem que os construiu não tinha pressa de viver. Ao contrário, passou a vida entregue a uma única tarefa: transformar em realidade a poesia da imaginação.
Gabriel Joaquim dos Santos nasceu em 1892, em São Pedro da Aldeia, região dos Lagos do Rio. Filho de uma índia e de um ex-escravo, ele tinha 20 anos quando decidiu construir a própria casa.
Numa noite de 1923, Gabriel sonhou que um enfeite em forma de flor embelezava a parede do quarto. A inspiração mudou a vida dele para sempre. Durante 63 anos, até morrer, ele se dedicou a enfeitar cada canto da casa que, para ele, era como uma história feita de sonho e pensamento.
Cacos de louça, flores partidas, uma borboleta. Azulejos quebrados, faróis, lustres de lâmpadas queimadas. Em cada pedacinho de lixo, ele via a possibilidade da criação.
A riqueza da casa da flor encantou o escritor Ariano Suassuna. “Na sua intuição genial, Gabriel Joaquim dos Santos encontrou o que muita gente erudita ainda procura. É uma arquitetura que realmente expressa o nosso país e o nosso povo”, diz o escritor.
O sobrinho-neto de Gabriel cresceu vendo a casa ser feita a cada dia e confessa com uma ponta de arrependimento: A gente achava que ele não batia muito bem. O mundo em que ele vivia era o mundo da arte e a gente não via aquela arte. Para a gente ele estava perdendo tempo, mas, na verdade, ele estava à frente.
A pesquisadora Amélia Zaluar criou um instituto para preservar e divulgar a casa. Ela conheceu Gabriel no fim da década de 70 e ainda se comove ao lembrar do homem que conseguiu transformar pedra em flor. “Ele era um homem que amava a beleza e que quis se cercar dela para viver feliz. Ele realizou o sonho dele. Ele literalmente viveu dentro desse sonho”, diz.

Fonte: Reportagens Especiais do Jornal Hoje
Por: Ana Luiza Guimarães, em 07/09/2004


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"E ali quase por um século, viveu um preto solitário, transformando a pedra em flor. Inutilmente. Ludicamente. Lindamente, com aquela pureza que só os iluminados têm... Com suas flores de pedra Seu Gabriel inventava a primavera. A primavera possível." (Afonso Romano de Sant’Anna)


Que possamos também transformar as nossas pedras em flores.




(Foto da Casa)

- De noite, acendo a lamparina, me sento nessa cadeira, oh, que alegria para mim! Quando eu vejo tudo prateado, fico tão satisfeito... Tudo caquinho transformado em beleza... Eu mesmo faço, eu mesmo fico satisfeito, me conforta... (Gabriel)


Para conhecer:

A Casa da Flor está situada no bairro Parque do Estoril, antigo bairro do Vinhateiro, na Estrada dos Passageiros, 232. São Pedro da Aldeia- Rio de Janeiro

Um comentário:

ViviaNNe SeNNa disse...

Estive visitando seu Blog. Ainda não tive tempo de ler muita coisa, mas me interessei e volto em outra oportunidade com mais tempo!

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