Por Luiz Vaz
Neste artigo irei tratar de um assunto que se mostra cada vez mais urgente, mas que parece ser de difícil assimilação pelos espiritualistas em geral: as relações entre as demandas espirituais e as nossas responsabilidades com a preservação do planeta. A primeira vista estes parecem dois assuntos díspares, mas será que são mesmo? Nos parágrafos seguintes buscarei mirar os holofotes nessa questão para que ela seja apreciada mais atentamente.
Não se devemos esperar grandes surpresas, nessa apreciação, de espiritualistas religiosos que se pautam por dogmas dos quais emanam um Deus mágico, com o poder de mudar o universo num estalar de dedos. Estes, em geral, acabam minimizando as nossas responsabilidades para com o futuro, deixando-o a cargo do divino; o que não deixa de ser um raciocínio justo, diante das características de Deus embutidas em suas crenças. A melhor apreciação que poderíamos esperar deste tipo de espiritualista teria relação com a noção de respeito à obra divina, seria esperar que eles se dessem conta que esse planeta é um ecossistema incubador de novos Espíritos, de seres que irão povoar o mundo espiritual após a morte, seja no Céu, seja no Inferno, ou onde quer que seja, e que o mínimo que podem fazer, em respeito a Deus, é tentar preservá-la. E esse tipo de reflexão já seria um grande avanço, diante da inércia e da falta de um discurso franco e reto, por parte dos líderes religiosos, que coloque essa questão na mesa de uma forma clara para os seus fiéis.
Mas e o que poderíamos esperar de espiritualistas que colocam Deus apenas como a causa primeira? Os que não o consideram um eterno supervisor e controlador das mazelas humanas? Opa! Espera aí! Uma outra pergunta acaba se impondo neste momento: existem realmente espiritualistas assim? É melhor não entrarmos nessa polêmica sob o risco de perdermos o foco do artigo, então, para facilitar as coisas, vamos apenas supor que existe uma classe de espiritualistas que considera que também somos responsáveis pelo nosso futuro; que fazemos parte de uma sociedade de espíritos, encarnados e desencarnados, que ajudou a construir o passado e que ajudará a construir o futuro, com a permissão de Deus, é claro! Será que essa suposta classe de espiritualistas poderia de alguma forma ajudar a conscientizar o restante da humanidade quanto a uma possível importância transcendente da preservação do planeta? Algo que ela jamais desconfiaria existir.
É bom lembrar que este planeta não se tornou um ecossistema incubador e acolhedor de espíritos humanos de uma hora para outra, foram necessárias eras e eras para torná-lo apto de construir um organismo biológico capaz de gerar e acolher espíritos com o poder de raciocínio e de emotividade que os humanos possuem, e que, portanto, precisamos refletir sobre o quão precioso ele é. Todos os equipamentos de exploração do universo que construímos nos dão conta do quanto é rara a conjunção de fatores que levam um planeta a abrigar a vida material, e mais rara ainda é a necessária para abrigar vida material inteligente, e com isso não estou pregando que a Terra seja a única no universo a fazer isso, é óbvio que ela não é, pois por mais rara que seja uma raridade, o que é ela diante da quase infinitude? Em resumo: que planetas capazes de abrigar a vida não são comuns, não são mesmo, estão mais para raros do que para comuns. E dentro da história desta raridade chamada Terra, participamos de um momento igualmente raro: aquele no qual uma espécie adquiriu, pelo raciocínio, o poder de mudar a história do planeta como um todo, seja para o bem, seja para o mal.
E junto com o conhecimento e o raciocínio sempre vem a responsabilidade...
Hoje, no meio espiritualista, muitos trabalham diretamente com os espíritos, e isso ocorre, mais corriqueiramente, no caso do Espiritismo e suas várias vertentes. Ainda não tive conhecimento de espíritos que tratassem esse tema com a gravidade que estou propondo, não sei se por falta de oportunidade, por falta de visão ou conhecimento, por terem crenças próximas às dos espiritualistas religiosos ou ainda, quem sabe, por enxergarem que este tema não possui uma real relevância para o mundo espiritual. Sim, conheço alusões deste tipo dentro na literatura espírita, sendo que uma delas diz que o mundo material poderia até não existir que isso não afetaria o mundo espiritual, mas ainda assim fico pensando: como podemos confiar em uma informação dessas se esses mesmos espíritos admitem desconhecer a origem dos espíritos humanos? Além do mais esse tema é sério demais para que possamos depositar toda a nossa confiança na opinião de um ou outro espírito. É preciso pesquisar mais junto a eles para dirimir essas dúvidas, e não poderia ser de outra forma; ficarmos reféns de informações de uma época onde a destruição do nosso habitat não dava pistas da dimensão que poderia chegar não é uma atitude prudente. Hoje adquirimos o poder de destruí-lo rapidamente, via hecatombe nuclear, ou mais lentamente, pela destruição contínua dos habitats, e essa dimensão destrutiva era algo inimaginável na época de Kardec. Nesse momento torna-se imperioso que algumas questões sejam reavaliadas junto aos espíritos, por exemplo: até que ponto precisamos deste planeta para reencarnar? Se os espíritos humanos só puderem reencarnar em corpos humanos e destruirmos a humanidade terrestre, como ficaríamos? Migraríamos para outro lugar? E haveria compatibilidade com corpos que tiveram outra história de formação? Afinal de contas, por que precisamos reencarnar? Precisamos reencarnar só por questões morais e evolutivas ou existem questões energéticas envolvidas nesse processo? Em ambos os casos: o que aconteceria se deixássemos de reencarnar por falta de corpos aptos para isso? Bem, se você acredita que essas questões já estão pacificadas em suas crenças, então essas minhas palavras talvez não lhe tenham muita serventia, pois elas são dirigidas aos que não fecharam questão sobre essas e muitas outras coisas, e que permanecem com as mentes abertas a novas informações.
Esse artigo nunca pretendeu fornecer um diagnóstico. O seu objetivo é, em primeiro lugar, o de incentivar novas pesquisas junto aos espíritos, porque sem o depoimento deles certamente ficaremos andando em círculos.
Não creio ser atitude prudente sentarmos no sofá, confiando que forças de cima sempre irão dar um jeito nas coisas, pois, a tirar pela história da Terra, mesmo para essas forças as coisas parecem demandar tempo, muito mais tempo do que necessita a nossa capacidade de destruição. Lavar as mãos e dizer que nada acontece por acaso, que tudo já está escrito ou que nada acontece sem a permissão divina também não deveria ser a atitude de um espiritualista prudente. As dúvidas são muitas, mas uma coisa parece certa: fingir que esse problema não existe não é a melhor forma de se lidar com ele.
Na filosofia materialista o momento é o que importa; consumir e viver ao máximo faz parte do raciocínio lógico dessa filosofia, e não haveria, por suas premissas, motivos para nos privarmos de algo por um futuro distante que, por não ser certo, não possui a relevância comparável a do presente. Então, não podemos esperar dos materialistas que eles enxerguem muito além dos seus narizes, pois lhes faltam as ferramentas para isso. Mesmo os materialistas mais éticos e conscientes possuem dificuldades em sentir a importância de um altruísmo ambiental, e são os sentimentos que nos movem, no final das contas, muito mais do que a racionalidade. Mas não podemos nos enganar achando que essas dificuldades se restringem a eles, os espiritualistas em geral também são assim, mesmo os que possuem uma apurada visão holística, isso porque normalmente os pensamentos que envolvem a vida espiritual possuem dificuldades para se misturar com os pensamentos destinados à vida material, como se tivessem propriedades diferentes, assim como a água e o óleo. Até a simples e óbvia conclusão de que nós mesmos poderemos sofrer, nas futuras encarnações, com a destruição que efetuamos hoje no meio ambiente, pode ser de difícil assimilação pelo pensamento da vida atual.
Caso exista mesmo, para o mundo espiritual, essa premência em relação a preservação do mundo material, cabe a nós, espiritualistas racionais, trazê-la a tona para mostrar aos encarnados a dimensão dos desafios que podem estar a nossa espreita, fincando-os de vez na pauta do nosso dia-a-dia. Somos os únicos a reunir condições para um dia, quem sabe, elevar a humanidade a um patamar mais holístico de pensamento.
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