terça-feira, 24 de abril de 2018

O Livro dos Espíritos – Um novo Paradigma


Por Milton R. Medran Moreira

É sempre oportuno recordar, no mês de abril, a elevada significação do marco inicial da doutrina espírita, que foi o lançamento, em 18/4/1857, de O Livro dos Espíritos.

Decorridos pouco mais de 150 anos desse acontecimento, pode-se dizer que o mundo não alcançou, ainda, o pleno amadurecimento histórico para dimensionar corretamente o valor dessa obra. O Livro dos Espíritos, fundamentalmente, é um convite a que se contemple o ser humano a partir de uma nova perspectiva: a sua dimensão espiritual.

É verdade que, antes dele, e ao curso de toda a chamada civilização cristã, nossa cultura sempre admitiu a existência da “alma” como um dos componentes da identidade individual humana. Mas, sabemos bem, a “alma” das religiões não corresponde exatamente ao conceito do “espírito” apregoado pela Doutrina Espírita. À luz dessa nova filosofia espiritualista, cujas bases foram lançadas há exatos 161 anos, o Espírito não é apenas um componente do ser humano. Para o Espiritismo, o homem não é um ser dotado de corpo e de espírito. Ele é, essencialmente, um Espírito provisoriamente dotado de um corpo físico. Preexistente e sobrevivente aos fenômenos do nascimento e da morte física, o Espírito constitui-se na verdadeira identidade intelectual, emocional e moral do ser humano. Seu arcabouço físico passa a ser, assim, mera instrumentalidade para a vida de relação na experiência encarnatória.

Bem visto, pois, O Livro dos Espíritos propõe à cultura ocidental e cristã um novo paradigma científico-filosófico. Lança um novo olhar sobre a natureza intrínseca do homem de que decorre, naturalmente, também, uma nova postura ética-moral do indivíduo e do gênero humano. Princípio inteligente do universo, como o definiu a questão 23 da obra aniversariante, é o Espírito, no seu estágio hominal, o responsável por seu próprio processo evolutivo, como indivíduo, e do mundo por ele habitado, como comunidade social planetária.

O novo paradigma ali proposto, muito mais do que uma nova ciência, um ramo novo da filosofia ou uma nova religião, conduz a uma síntese conceitual que, corretamente assimilada, pode marcar uma nova etapa para a história da humanidade. Não será exagero dizer que, mesmo com seu razoável avanço no mundo, poucas pessoas mostram-se aptas a assimilar essa essencialidade intrinsecamente revolucionária espírita.

Um intelectual, amigo de Allan Kardec, o teatrólogo Victorien Sardou, talvez tenha percebido toda essa abrangência quando, ao receber um exemplar da primeira edição de O Livro dos Espíritos, agradeceu-lhe escrevendo ao ilustre professor:

“É o livro mais interessante e instrutivo que já li. É impossível que não alcance enorme repercussão. Todas as grandes questões de metafísica e de moral estão ali elucidadas da maneira mais satisfatória; todos os grandes problemas foram resolvidos ali inclusive aqueles que os mais ilustres filósofos não puderam resolver. É o livro da vida, é o guia da humanidade”.

“Livro da vida” e “guia da humanidade” não pode, pois, ser apresentado como se fora um livro sagrado de um segmento religioso. Se o temos como referência, não nos será lícito comportarmo-nos como integrantes de uma nova seita, dissociada da cultura humana e alheia ou oposta ao fluxo imprimido pela vocação renovadora e progressista do “Espírito”. Se as ideias magnificamente sintetizadas em O Livro dos Espíritos guardam, efetivamente, esse caráter de universalidade, elas iluminarão o mundo, com ou sem o Espiritismo, pela “própria força das coisas”, como costumava dizer Kardec. Muitos dos conceitos ali antecipados já são, hoje, consensos no mundo civilizado. Outros aguardam o devido amadurecimento, estágio para cujo advento contribuem todos os homens de boa vontade, entre os quais, necessariamente, devem estar os espíritas.

Texto atualizado, artigo publicado originalmente pelo autor em 04/2009, portal O Consolador.

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