Por Angélica
dos Santos Simone
Para que a
reforma íntima seja completa, a etapa seguinte refere-se ao descanso da terra,
pois todo solo necessita do pousio. Como nada na natureza é passível de eterna
movimentação, tudo que existe, esteja ou não em processo de configuração, de
transformação ou de criação, necessita de um momento de calmaria para que as
partículas aquietem-se, tranquilizem-se para se preocuparem somente em
assimilarem todo este processo.
Estamos
sensíveis e temos esparadrapos por todo o corpo, o coração está inquieto, mas
aliviado, apenas necessita de silêncio. Precisamos, em dados momentos de nossas
vidas, de paz, de tranquilidade, reduzir a velocidade, manter-se em silêncio.
Isso não significa que me ausentarei de meus compromissos e de minhas
atividades diárias, somos seres em constante atividade (lembremo-nos do
pensamento), é difícil não pensar. Quando o lavrador cumpriu a sua parte,
quando completou todas as etapas incumbidas a ele no preparo da terra, ela
carece então, do devido descanso para receber as sementes que virão.
Recordaremos
que tal processo não é uma reta ascendente, pois diante de toda decisão,
mudança e aprendizado, eu devo disciplinar a mansidão de meu Espírito para que
ele esteja sempre em paz. Só alcançarei a paz em mim se eu me disciplinar na
postura diária de análise de minha conduta mental.
Um terreno
humilde (aquele que contém húmus, adubo) poderá receber as sementes que se
desenvolverão, pois ele possui os elementos exigidos para tal fase. Quando nos
encontramos em meio a uma tempestade, não é possível enxergarmos o que está à
nossa frente, assim, é nossa função nos acalmarmos e termos paciência em
aguardar as nuvens dissiparem-se e então podermos observar o que nos é
mostrado.
Da mesma
maneira acontece com o terreno. O seu estado de agitação é resultado de um
incômodo gerado por uma reação àquilo que não queremos aceitar ou que não
queremos corrigir em nós, em outras palavras, é resultado do Orgulho. O orgulho
apresenta-se latente em nós, perceptível somente quando as situações nos
envolvem e quando, através da ansiedade, manifestamos as nossas opiniões
irrevogáveis. Como não nos conhecemos, não consentimos que nós sejamos seres
orgulhosos, mesmo que em baixo grau, mas a sua existência é suficiente para
defini-lo. É necessário humildade para admitir o nosso orgulho.
Diante das
experiências, o homem orgulhoso produz uma movimentação energética sempre que
suas afirmações são questionadas. Certa feita, um aprendiz perguntou a Gandhi
quantas vezes ele havia perdoado em sua vida, ao que Gandhi respondeu:
- Nenhuma!
Esta
resposta foi uma surpresa para o seu seguidor. Gandhi, compreendendo a reação
de seu interlocutor, explicou:
– Nunca me
senti ofendido, por isso nunca senti a necessidade de perdoar.
Como um
terreno fértil, Gandhi não se sentiu ofendido, ou seja, a sua paz não foi
afetada pelas forças externas dirigidas a ele. Algo semelhante ocorreria se as
águas de um lago não formassem ondas quando atirássemos alguma pedra em sua
superfície.
A emoção é
resultado ou produto do orgulho. Por conta disso, ela se mostra confusa,
transitória, intensa, mutável e incômoda, donde advém um mal-estar, pois sempre
surge a ansiedade. Uma força causou a perturbação no meio; se este meio fosse
possuidor de alguns atributos, tal perturbação geraria uma resposta diferente,
o lago teria a capacidade de lapidar a pedra arremessada, respondendo com um
lindo cristal.
Somos
reatores nucleares, reagimos em intensidade e em proporção às forças que nos
perturbam, geramos emoções que são capazes de destruir o nosso sistema orgânico
e mental e não nos atentamos para esses detalhes que fazem parte de nosso
cotidiano, de dia em dia os anos podem ser fatigantes.
Quando
alcançarmos a compreensão do “ser humilde” e para isso é necessário o
conhecimento, saberemos que a única maneira de neutralizar as reações será
produzindo (e não re-produzir) Amor. Esta produção inicial será utilizada para
resguardar o nosso organismo físico e mental e gerar uma capa protetora em
volta de nosso campo energético, de modo que qualquer emanação imprópria
direcionada ou assimilada por nós, não nos afetará. Lembremos que o amor é uma
força capaz de dissolver qualquer construção contrária à proposta de Deus para
nossas vidas.
Após
cuidarmos de nosso templo, o amor produzido será emanado, transmitido para
outrem, pois assim ocorre quando utilizamos a enxada em nosso terreno e
encontramos uma pedra preciosa. O avarento deixá-la-á enterrada ou escondê-la-á
em qualquer outro lugar, mas o humilde vai trazê-la para a superfície e
compartilhá-la-á com todos. O amor é esta pedra preciosa.
Durante o
pousio, o nosso solo está assimilando tudo que foi feito nele e preservando os
elementos necessários e dispondo-os de modo que a semente se sinta aconchegada
quando for lançada pelo semeador. Desta maneira age o amor em nosso interior;
ele organiza cada elemento orgânico e mental com o intuito de que ambos
trabalhem na fertilidade constante do solo e para que ele sempre esteja pronto
nos momentos de enfrentamento das intempéries que o atingirão enquanto ocorre a
germinação. O semeador passará uma vez, arremessará a sua melhor semente,
retornará depois de um tempo para ver como está o canteiro e reclamará ao
lavrador se algo provocar o comprometimento de uma colheita saudável. Lembrará
ao lavrador que, cada vez que ele vier semear, o solo deve estar adequado para
receber sementes diferentes, pois cada semente exige os recursos e elementos
apropriados para sua germinação.
Cada
ensinamento transmitido por Jesus só é aproveitado pelos Espíritos que se
propõem a manter constante vigília de seus pensamentos e atos, cultivando o
amor e a prece para se protegerem contra as intempéries e ervas daninhas,
mantendo a fé na evolução e regando a humildade para que sua árvore possa
oferecer deliciosos frutos!
Angélica dos Santos Simone é geógrafa e mestranda em Geografia Física pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. É diretora de ‘Arte e Cultura Espirituais’ do Grupo Espírita União das Fraternidades para uma Nova Aliança (www.nova-alianca.org) em São Paulo.
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