Pilatos, tendo entrado de novo no
palácio e feito vir Jesus à sua presença, perguntou-lhe: “És o rei dos judeus?”
— Respondeu-lhe Jesus: “Meu reino não é deste mundo.”
“Disse-lhe então Pilatos: “És,
pois, rei?” — Jesus lhe respondeu: “Tu o dizes; sou rei; não nasci e não vim a
este mundo senão para dar testemunho da verdade. Aquele que pertence à verdade
escuta a minha voz.” (João, 18:33)
A VIDA FUTURA
Por estas palavras, Jesus se
refere claramente à vida futura, que ele apresenta, em todas as circunstâncias,
como o fim a que se destina a humanidade, e como devendo ser o objeto das
principais preocupações do homem sobre a terra. Todas as suas máximas se
referem a esse grande princípio. Sem a vida futura, com efeito, a maior parte
dos seus preceitos de moral não teriam nenhuma razão de ser. É por isso que os
que não crêem na vida futura, pensando que ele apenas falava da vida presente,
não os compreendem ou os acham pueris.
Esse dogma pode ser considerado,
portanto, como o ponto central do ensinamento do Cristo. Eis porque está
colocado entre os primeiros, no início desta obra, pois deve ser a meta de
todos os homens. Só ele pode justificar os absurdos da vida terrestre e
harmonizar-se com a justiça de Deus.
Os judeus tinham ideias muito
imprecisas sobre a vida futura. Acreditavam nos anjos, que consideravam como os
seres privilegiados da criação, mas não sabiam que os homens, um dia, pudessem
tornar-se anjos e participar da felicidade angélica. Segundo pensavam, a
observação das leis de Deus era recompensada pelos bens terrenos, pela
supremacia de sua nação no mundo, pelas vitórias que obteriam sobre os
inimigos. As calamidades públicas e as derrotas eram os castigos da
desobediência. Moisés o confirmou, ao dizer essas coisas, ainda mais
fortemente, a um povo ignorante, de pastores, que precisava ser tocado antes de
tudo pelos interesses deste mundo. Mais tarde, Jesus veio lhes revelar que
existe outro mundo, onde a justiça de Deus se realiza. É esse mundo que ele
promete aos que observam os mandamentos de Deus. É nele que os bons são
recompensados. Esse mundo é o seu reino, no qual se encontra em toda a sua
glória, e para o qual voltará ao deixar a Terra.
Jesus, entretanto, conformando o
seu ensino ao estado dos homens da época, evitou lhes dar os esclarecimentos
completos, que os deslumbraria em vez de iluminar, porque eles não o teriam
compreendido. Ele se limitou a colocar, de certo modo, a vida futura como um
princípio, uma lei da natureza, à qual ninguém pode escapar. Todo cristão,
portanto, crê forçosamente na vida futura, mas a ideia que muitos fazem dela é
vaga, incompleta, e por isso mesmo falsa em muitos pontos. Para grande número,
é apenas uma crença, sem nenhuma certeza decisiva, e daí as dúvidas, e até
mesmo a incredulidade.
O Espiritismo veio completar,
nesse ponto, como em muitos outros, o ensinamento do Cristo, quando os homens
se mostraram maduros para compreender a verdade. Com o Espiritismo, a vida
futura não é mais simples artigo de fé, ou simples hipótese. É uma realidade
material, provada pelos fatos. Porque são as testemunhas oculares que a vêm
descrever em todas as suas fases e peripécias, de tal maneira, que não somente
a dúvida já não é mais possível, como a inteligência mais vulgar pode fazer uma
ideia dos seus mais variados aspectos, da mesma forma que imaginaria um país do
qual se lê uma descrição detalhada. Ora, esta descrição da vida futura é de tal
maneira circunstanciada, são tão racionais as condições da existência feliz ou
infeliz dos que nela se encontram, que acabamos por concordar que não podia ser
de outra maneira, e que ela bem representa a verdadeira justiça de Deus.
O Evangelho Segundo o Espiritismo, capII, Allan Kardec
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