segunda-feira, 5 de junho de 2017

A Gênese, de Allan Kardec¹


Último tomo da Codificação Espírita, publicado em janeiro de 1868, o livro “A gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo”, como o título indica, aborda três temas diversos, quais sejam: A Gênese do Universo, do nosso orbe e do ser humano, a natureza dos Milagres e por último, o fenômeno das Predições, todos analisados segundo o Espiritismo e agrupados em um volume, que, com o passar dos anos, ficou mais conhecido como “A Gênese”.

As demais obras da Codificação foram organizadas e comentadas por Allan Kardec, mas podemos afirmar que “A Gênese”, à exceção do Capítulo VI – Astronomia Geral, é da sua autoria.

O livro aborda inicialmente a questão, à época delicada, face à reação dos setores refratários à doutrina nascente, do caráter e da validade da revelação espírita. Ao invés de tratar o assunto em um prefácio, Allan Kardec optou por promovê-lo merecidamente a tema do primeiro capítulo, “Fundamentos da Revelação Espírita”, conferindo ao assunto status de leitura obrigatória, face à sua importância para o esclarecimento dos fundamentos da doutrina.

Por meio de doze perguntas que são propostas e a seguir respondidas com clareza, lisura e lógica irretorquíveis, coloca-se um ponto final nesta questão, até então controversa, da origem, natureza e validade da Doutrina dos Espíritos.

A Gênese em si é abordada a partir do Capítulo II, e, digamos assim, começa do início, estudando Deus, potência soberana do Universo e causa primária de tudo e de todos, no que tange à sua existência e aos seus atributos, colocando em evidência uma qualidade Sua que é muito cara a todos nós, a de que “Deus é soberanamente Justo e Bom”. Nos itens que se seguem, abordam-se os possíveis mecanismos da Sua providência, culminando com a análise da sempre fascinante possibilidade (ou não) de podermos “vê-lo”.

E a Gênese prossegue no Capítulo III com a questão do bem e do mal, nos remetendo aos domínios filosóficos da ética na análise da sua causa e manifestação, bem como na sua diferenciação face à inteligência e ao instinto, e encerra o capítulo abordando o fato sempre intrigante, reconhecida a justiça e bondade infinitas do Criador ressaltada no Capítulo II, da destruição dos seres vivos uns pelos outros.

No Capítulo IV, Kardec confere justa relevância à contribuição da Ciência para o progresso da Humanidade, e segue no capítulo V, “Antigos e Modernos Sistemas do Mundo”, analisando a evolução da nossa visão de mundo, desde a crença antiga de uma Terra plana até o multiverso na atualidade.

No portentoso Capítulo VI, onde o médium Camille Flammarion é citado como sendo o receptor das comunicações do Espírito denominado Galileu, nos entretém com considerações belíssimas sobre o Universo, o espaço e o tempo, a unidade do princípio aliada à diversidade infinita das manifestações, todos conceitos que permanecem mais do que atuais nos dias de hoje.

No Capítulo VII, “Esboço Geológico da Terra”, faz um estudo detalhado da formação e evolução do nosso planeta, prosseguindo nos dois capítulos seguintes com as “Teorias Sobre a Formação do Mundo” e as “Revoluções do Globo”.

E adentrando o belíssimo Capítulo X aborda a questão máxime do surgimento e evolução da vida, introduzindo o conceito, hoje consagrado, do princípio vital, e abordando ainda ao longo do texto a querela científica, à época para lá de controversa, da biogênese (a teoria consagrada que propugna que todo ser vivo procede de outro ser vivo) em contraposição à geração espontânea (a teoria – hoje absolutamente superada – que propunha que os seres vivos poderiam “surgir” da matéria inorgânica), imbróglio que só foi encerrado após o seu decesso, e que o levou, muito sabiamente, a solicitar à posteridade que desse a última palavra sobre o assunto.

Allan Kardec encerra este Capítulo estabelecendo um importantíssimo elo entre as ciências físicas e a Doutrina Espírita, afirmando: “Galgado o ponto em que nos achamos com relação à Gênese, o materialismo se detém, enquanto o Espiritismo prossegue em suas pesquisas no domínio da Gênese espiritual.”

E assim, somos introduzidos ao Capítulo XI, descortinando-se aos nossos olhos embevecidos a gênese do Espírito, só possível através das revelações da Doutrina Espírita, expandindo o conhecimento humano para além dos domínios da matéria densa, através da contribuição da Humanidade na erraticidade, versando sobre assuntos de magna importância para todos nós, como a natureza do princípio espiritual e o processo da reencarnação, entre outros.

E “A Gênese” encerra-se no Capítulo XII, “Gênese Mosaica”, comparando o texto bíblico com as teorias científicas, e analisando os episódios narrados no mito de Adão e Eva, com conclusões que se constituem em verdadeiras joias do intelecto humano. Ao final, rende justo culto ao Espiritismo “como a luz através da qual o homem sabe doravante de onde vem, para onde vai e por que está na Terra e por que sofre”.

No Capítulo XIII analisa a natureza dos Milagres, seguido pelo importantíssimo Capítulo XIV, “Os Fluidos”, estudando a sua natureza, aplicação e manifestação, embasando cientificamente os fenômenos mediúnicos, para então, no capítulo seguinte, e à luz destes conhecimentos, analisar os “milagres” praticados por Jesus.

A partir do Capítulo XVI aborda-se a questão instigante da capacidade de prever, de antever o que nós chamamos de futuro, ou seja, a questão da presciência, para, da mesma forma que no opúsculo dos milagres, também analisar no capítulo que se segue e à luz do arcabouço teórico apresentado, as predições de Jesus.

E, convenientemente no último capítulo do livro, “São Chegados os Tempos”, é feito um estudo da questão relevante da transição planetária, tema de uma atualidade ímpar, discorrendo sobre a necessidade de uma renovação da Humanidade, substituindo-se os espíritos ainda renitentes no mal por outros que contribuirão, juntamente com os que permanecerem, para a elevação do nosso planeta de mundo de provas e expiações a orbe regenerado, processo que se encontra em pleno curso.

Em 1995 fui convidado pelo nosso querido e saudoso Altivo Carissimi Pamphiro, então Presidente do Centro Espírita Leon Denis, no Rio de Janeiro, para proceder à revisão dos temas científicos da “Gênese”, que após 137 anos encontravam-se algo defasados. O trabalho foi então efetivado através de notas de rodapé e, onde cabível, com a inserção de imagens, tabelas e gráficos, revigorando “A Gênese” para o deleite dos leitores do Século XXI. O livro revisado foi publicado pela Editora CELD em 2003 e encontra-se na sua terceira edição.²

Cláudio Lirange Zanatta

¹ Crédito: Publicado originalmente na Revista Cultura Espírita, do Instituto de Cultura Espírita do Brasil-ICEB, p. 12-13, edição janeiro/2012.

² KARDEC, Allan. A gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Tradução de Albertina Escudeiro Sêco; revisão técnica, atualização de termos técnico-científicos e ampliação com ilustrações: Cláudio Lirange Zanatta. Rio de Janeiro: CELD, 2005.

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