sábado, 20 de abril de 2013

À Luz da Oração




Na bibliografia relacionada à prece é mais conhecido o trabalho do Rhys Davis, que recolheu textos de budismo arcaico, a compilação de Zimmern e de Gressmann para a religião assírio-babilônia, a espécie de breviário de Neumann, limitado à prece dos monges da Índia e de diversas tentativas de se recolherem às preces cristãs.

Como não poderia deixar de acontecer, essa preocupação se fez sentir no espírito de Allan Kardec, que nos ofereceu o legado famoso de suas preces, cujas edições não conhecem limite.

Mas esta é a primeira vez que se tenta reunir preces psicografadas, e, o que é melhor, devidas à atividade mediúnica deste que é reconhecido como o mais famoso psicógrafo do mundo: Francisco Cândido Xavier.

Para quem tenha dúvidas quanto ao caráter religioso do Espiritismo, este é também um livro para afastar vacilações, já que a prece é o fenômeno central da vida religiosa. No dizer de Deissmann "a prece caracteriza uma religião, uma época religiosa, um homem religioso, de maneira mais eficaz que a mitologia, a legenda, o dogma, a moral ou a teologia".

Ora, este livro é um vasto panorama em que os Espíritos oram. E sendo o Espiritismo a religião dos Espíritos, aqui se encontram os elementos mais válidos para caracterizá-lo, mesmo porque neste contexto não se encontram, obviamente, preces litúrgicas, porém alitúrgicas e pessoais, conservando, em ritmos sugestivos e vários, o diálogo eterno entre o homem e Deus, entre a mente fixada em seu espaço e em seu tempo e as energias cósmicas.

Reunimos textos de poetas e escritores famosos já desencarnados, com Humberto de Campos, Ruy e João de Deus, mas, igualmente a contribuição de ignoradas Entidades, tais Aparecida e Aniceto, em expressões desde as mais singelas às mais complexas pelo sentido religioso, de sorte que, lendo estas páginas, nos sentiremos como que suspensos nos fios de um mistério infinito em meio ao qual as vozes que se erguem identificam-se por toda parte reconhecemos essa substância central do fato religioso, isto é, a forma pela qual a prece encontra sua expressão na latente confiança em uma intervenção providencial.

Um duplo valor, documentário e poético, justifica esta antologia, um itinerário formoso e inesperado entre almas imobilizadas no instante mesmo em que estabelecem seu colóquio com Deus.

"A prece - escreveu Heiler - é o coração, o ponto central da religião e não é nos dogmas, nas instituições, nos ritos, nas ideias morais que podemos descobrir a substância da vida religiosa, mas nesse conjunto de reações individuais da alma religiosa em face do cosmos, sentimento do infinito do espaço e do tempo, da ordem e da harmonia do cosmos, do reconhecimento ao mesmo tempo pleno de terror e de maravilha do caráter limitado da criatura".

A caracterização e análise de tais sensações, de seu valor emocional, da aparição de elementos éticos e normativos, de elementos de devoção e de elementos racionais na consciência religiosa, a definição consequente de relações entre emotividade e racionalidade moral, tais são os elementos que podemos encontrar aqui.

A prece abre um circuito emocional entre os dois termos fundamentais da experiência religiosa, Deus e o homem e, por tal motivo, julgamos preferível a organização dos capítulos entre "Meditações" de Emmanuel, contendo valores de movimento, de posição e de orientação da prece.

Esse esforço se concretiza com o apêndice em que os Espíritos exprimem forças positivas, determinadas, prestes a se efetivarem, oferecendo elementos para a observação e o estudo constante em regras de comportamento, propondo a concordância entre a intenção e a ação.

Foi puramente ocasional que as preces reunidas nesta "Antologia" se distingam pelo caráter verbal e poético.

Comentando o poder comunicativo da palavra, de que a prece se serve, já Di Nola dizia, concordando com os Evangelhos que os logos, verbum, é energia oculta de onde o mundo tira sua forma harmônica, constituindo, ao mesmo tempo, imploração que persuade e se insinua, injunção indiscutível, pranto aflitivo, exuberância de um grito de alegria e glória.

Uma pesquisa linguística, ainda que limitada, nos leva à uma confirmação da função da prece, pois que prece é pedido nas palavras prex, precor, da raiz indo-européia perek (pedir), representativa do conceito de pedir com palavras para obter, comum no sânscrito prât (prece), no úmbrio persuinu alemão fraga (pedido), no irlandês arco (eu oro). Outras vezes representa-se o conceito de prece supplicatio correspondente ao grego proschineo, que vem da raiz pel (dobrar), evidente na palavra supplice -subplico, do grego ichesia que, segundo a conjectura etimológica mais provável, vem do radical seich (estender a mão).

A prece espírita é pessoal, individual, alitúrgica. É evidente que a relação homem-Deus está toda inteira contida na intimidade da alma individual, é uma predisposição, uma inclinação do espírito a solicitar, a glorificar, a se abandonar, é, no dizer de Agostinho, a sede que só encontra alívio na paz da fonte divina.

Assim sendo, considerar a prece nesse estado de intimidade, tal como a inexprimível. As experiências contidas neste livro auxiliam, porém, a compreender como é possível passar de uma forma preliminar de prece elaborada à prece pessoal propriamente dita, emocional e mental. A própria necessidade vital de se extravasar, de se manifestar, leva o indivíduo a dar expressão ao seu impulso interior, na tentativa de defini-lo.

O apêndice deste livro, no qual abnegadas Entidades assinam estudos diversos sobre a prece, leva-nos a concebê-la como uma pura condição espiritual do exercício, de atos de pacificação e passividade numa sucessão gradual de aperfeiçoamento e de conquistas interiores.

No que concerne aos Espíritos que assinam as diferentes páginas, interessa-nos sobretudo a compreensão do processo de formação de uma consciência inteiramente livre e marcada pelos caracteres de personalidades altamente religiosas. De sorte que, como contexto, esta obra concerne particularmente à psicologia religiosa, à história de grandes consciências que se sublimaram e passam a exercer decisiva influência no desenvolvimento do movimento espírita, que deve levar de volta ao Cristianismo à sua verdadeira perspectiva. O estudo de cada uma das preces aqui contidas, sob os recursos de compreensão oferecidos pelo Espiritismo, esclarece todos os mecanismos psicológicos nos quais ela tem sua origem, no quadro de experiências nitidamente espirituais e que promove o impulso à prece como uma manifestação puramente interior.

Por outro lado revela aqui que a prece não pode assumir caráter estático e tradicional se quiser manter seu poder natural de sugestão. Neste sentido é lícito considerar que a Prece Dominical, proposta por Jesus, é uma eficácia inicial, determinando, no exercício da prece, condições de emoção e contacto com os níveis superiores da realidade, com a finalidade, entretanto, de que, de tal esforço, resulte a centelha inicial da prece pessoal e, conforme o próprio Cristo propõe, individual.

Enquanto as liturgias oficiais entram em decadência, o Espiritismo esforça-se, por um novo caminho, a motivar a predisposição religiosa natural do espírito humano. Eis o que nos levou a realizar esta "Antologia" na qual o leitor poderá, através de fácil leitura, estabelecer relação com a carga emotiva de inteligências realmente voltadas para uma "religação" e dispostas, conforme a passagem de Paulo, o Apóstolo, a vivificar a letra pelo espírito.

Eis que porque nestas páginas agita-se a labareda, em mais puro estado, da grande religião do Consolador Prometido, elaborada na divina ambição de fazer com que se comunique o Eu e o Outro, o Sujeito e o Objeto, o Ser Humano e o Ser Cósmico.

Emmanuel

Prefácio do livro À Luz da Oração, de Francisco Cândido Xavier, por Espíritos diversos.

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